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Amor como ideologia

Amor como ideologia

Publicado em: 17 de agosto de 2018 às 14:11
Atualizado em: 29 de março de 2021 às 19:23

Polarização política entre direita e esquerda não

abala o relacionamento de jovem casal santa-cruzense

OPOSTOS UNIDOS — Casal diz que procura não discutir política: Isabele se define como de esquerda, enquanto Luiz é conservador tradicionalista



Diego Singolani

Da Reportagem Local

Ela é feminista, de esquerda e defende políticas voltadas às minorias. Ele, por sua vez, se declara conservador, pró Bolsonaro e acredita no ideal da família tradicional. Em um período de ferrenha polarização política, diferenças ideológicas tão latentes não se tornaram obstáculo para que um insólito casal se formasse em Santa Cruz do Rio Pardo. Luiz Fernando Jardim, 24, é corretor de imóveis. Isabela Gonzís, 21, é atriz e atualmente trabalha como vendedora.

Os jovens namoram há um ano e três meses e já fazem planos de casamento. “O importante é ter respeito. Mesmo que eu não goste de alguma coisa, eu faço para deixar ela feliz”, diz Luiz Fernando.

O relacionamento é inusitado desde o primeiro encontro. No ano passado, Isabela estreava a peça “Léo e Bia”, um texto de Oswaldo Montenegro, que retrata a história de jovens atores em busca de liberdade no auge da ditadura militar no Brasil. Luiz Fernando, notório admirador do militarismo, foi assistir ao espetáculo exclusivamente por causa de sua futura namorada. “Eu tinha visto a Isabela em um festival e me interessei. Procurei ela nas redes sociais. Trocamos algumas mensagens e eu disse que iria assistir a peça, mesmo não sendo muito fã de teatro”, conta Luiz.

Ao final da apresentação, Isabela e os demais integrantes do grupo teatral foram para um bar, acompanhados por Luiz. “Em algum momento o assunto da mesa acabou indo para a política. O Luiz tinha uma opinião bem diferente da minha e dos meus amigos, mas eu não quis polemizar. Estava eufórica pela estreia”, relembra Isabela.

Na hora de ir embora, Luiz insistiu para levar Isabela até sua casa. Relutante no início, ela acabou aceitando a carona. Ao chegar no endereço e descer do carro para se despedir, Isabela teve uma surpresa. A mensagem ‘apoio Jair Bolsonaro’ estampada em letras garrafais na parte traseira do veículo. “Eu não tinha percebido no momento que entrei. Meus amigos sim, inclusive filmaram a cena”, revela Isabela. “Fui o primeiro a adesivar o carro em apoio a Bolsonaro em Santa Cruz”, afirma Luiz, orgulhoso. A partir daí eles se encontraram algumas vezes, até decidirem namorar.

Em tempos de cólera

Pode-se dizer que Luiz Fernando e Isabela levam às últimas consequências o sentido da expressão “os opostos se atraem”. O casal garante que política não é um assunto recorrente na relação, apesar de já ter gerado atritos. “Nunca chegamos a brigar feio sobre o tema. Quando percebemos que a discussão pode extrapolar, a gente para e foca nas coisas importantes que dividimos”, diz Isabel.

Para Luiz, o segredo da convivência saudável é a coerência e o amor. “Não concordamos em algumas posições, mas temos que respeitar as características de cada um”, afirma.

Luiz Fernando comemora o crescimento da direita no Brasil. Para ele, os valores morais foram desvirtuados ao longo dos últimos anos e este é o momento de resgata-los. “A cultura foi se desfazendo. Os papéis da mãe e do pai, do homem e da mulher foram deixados de lado”, disse.

Mesmo tendo nascido após a redemocratização do País, Luiz se mostra um admirador da ditadura militar. Apesar das perseguições, torturas e mortes, o jovem corretor de imóveis salienta que, na visão dele, houve grandes feitos naquele período, como as obras de infraestrutura. “Teve aspectos bons e ruins. Eu comparo com uma grande empresa que fez muitas coisas importantes, mas não agradava todos os seus funcionários”, afirmou.

Já Isabela defende a liberdade. Ela rejeita rótulos e classificações. “Minha visão é aberta. Sobre o conceito de família, por exemplo, respeito qualquer configuração”, diz.

Feminista convicta, Isabela acredita ser fundamental a luta por diretos iguais entre mulheres e homens. “Além disso, as pessoas devem ser livres para se manifestar da forma que quiserem”, pondera. A atriz, ao contrário do seu namorado, encara como importantes políticas voltadas para minorias, inclusive os sistemas de cotas. “Eu analiso a questão histórica por trás dessas desigualdades e acho que deve haver, realmente, uma reparação”, afirma.

Casal aprendeu a respeitar a ideologia política do outro



Futuro

O casal já tem planos para se casar. Luiz diz que, assim que começar a construir sua casa, eles darão o próximo passo no relacionamento. Sobre os filhos, que também estão nos planos, ambos garantem que não pretendem impor nenhum tipo de ideologia durante a criação. “Nós vamos apresentar nossas visões, assim como ele ou ela terá contato com informações fora do ambiente familiar. Dessa forma, a criança poderá construir sua própria personalidade”, disse Isabela.

Com tantas diferenças, as afinidades compartilhadas por Luiz e Isabela têm um papel crucial na manutenção do namoro. Obviamente, o amor é o que fundamentalmente os une. Porém, os hábitos em comum e personalidade parecida ajudam. “Nós dois somos introvertidos. Também gostamos muito de ler e temos um gosto musical bastante eclético”, revela Isabel.

De volta à política, a harmonia entre o casal poderá ser posta à prova durantes as eleições que se aproximam. Nesse aspecto, o discurso de fazer concessões para agradar o parceiro terá limitações, pelo menos por uma das partes. “Jamais iria a um comício de algum candidato e esquerda. Nem arrastado!”, afirma Luiz Fernando.

Já Isabela é menos radical. “Eu poderia ir em um evento do Jair Bolsonaro. Não tendo que votar nele, está tudo bem”, brinca.
SANTA CRUZ DO RIO PARDO

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