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Otacílio lavra a escritura definitiva da compra do patrimônio do BAC

Otacílio lavra a escritura definitiva da compra do patrimônio do BAC

Publicado em: 02 de outubro de 2020 às 11:44
Atualizado em: 30 de março de 2021 às 12:44

Cartório pode não ter observado regras do estatuto do clube que foi dissolvido e seu patrimônio vendido por preço aquém do real

Sérgio Fleury Moraes

Da Reportagem Local

Apesar da polêmica da compra do patrimônio que sobrou do antigo BAC — Barrigudos Atlético Clube —, da suspeita da operação não ter seguido as regras do estatuto da instituição e da possível improbidade administrativa, o prefeito Otacílio Parras (PSB) conseguiu lavrar a escritura definitiva da área cuja venda foi efetivada no ano passado. O estranho negócio também não foi investigado pelo Ministério Público, mas um grupo de 23 antigos sócios preparam uma ação judicial para tentar anular a transação.

Otacílio comprou a área depois que ele próprio, como prefeito, inviabilizou a continuidade do BAC. Em 2017, ele anunciou que iria retomar uma área de quase 20.000 metros que pertencia ao município. O terreno foi cedido por comodado ao BAC em 1988, na gestão de Onofre Rosa de Oliveira, e foi usado para a construção de um conjunto esportivo, inclusive um campo de futebol. Na época, em entrevista ao jornal, o prefeito disse que tinha planos de construir uma unidade do “Cras” no local.

Sem a área maior a partir de 2018, o BAC ficou apenas com sua sede social, de 2.100 metros (85,80 de “testada”), que possui, entre outras acomodações, salão de festas, cozinha com churrasqueira, sauna, sanitário e vestiário. O imóvel é equivalente a sete lotes de frente para a rua Antonio Lamino, no bairro Jardim Fernanda.

Com o fim da área esportiva, o clube se inviabilizou. A ata de uma reunião realizada no dia 7 de novembro de 2019 é clara neste sentido, quando diz que não havia mais a participação dos associados em razão da retomada da área pela prefeitura. A mesma ata, entretanto, informa o “interesse” de Otacílio Parras na aquisição do imóvel. Era a chance do município construir finalmente uma unidade do Cras, conforme havia anunciado Otacílio menos de dois anos antes.

No entanto, a oferta do prefeito não era aem nome do município, mas para o patrimônio particular de Otacílio. O documento diz que os associados presentes à reunião aceitaram a proposta de R$ 295 mil pelo patrimônio do clube. Onze sócios assinaram a ata e o pagamento foi feito dentro de um cartório, quando Otacílio assinou vários cheques para distribuir entre os associados beneficiados. Segundo consta, houve o ingresso posterior do espólio de um associado, totalizando 12 beneficiados com o dinheiro. Os cheques, segundo contou o próprio Otacílio, foram preenchidos por uma funcionária do cartório.

Mapa mostra os sete lotes da área total do BAC, hoje pertencente ao prefeito Otacílio



Está claro que o grupo de associados resolveu se reunir em assembleia depois de receber uma oferta do prefeito Otacílio. Embora a data da transação não tenha sido divulgada por Otacílio, foi uma negociação muito rápida. A ata foi registrada em cartório um mês após a assembleia e, em seguida, houve o pagamento.

Entretanto, o estatuto do clube, registrado em cartório desde 2015, proíbe a venda do patrimônio a particulares. De acordo com o documento, no caso de dissolução o imóvel deve ser transferido para uma instituição de caridade.

Quando o DEBATE publicou uma reportagem sobre a possível irregularidade, Otacílio reagiu afirmando que “não era problema dele” a divisão do dinheiro. Disse que o patrimônio do BAC estava à venda “há muitos anos”, mas esta informação era desconhecida pela maioria dos corretores de imóveis da cidade. Aparentemente, somente um corretor sabia do negócio, Irineu Gozzo, que presta serviços à prefeitura e é considerado “amigo número um” pelo próprio prefeito. Irineu já teve um neto nomeado assessor, com salários de R$ 8 mil, sem que até correligionários soubessem. Um ano depois da nomeação e um dia após a notícia publicada pelo jornal, o assessor pediu exoneração. Para participar da transação do imóvel do BAC em nome do prefeito, Gozzo recebeu R$ 5 mil do prefeito.

Prefeito pode ter se beneficiado de uma medida administrativa para adquirir o patrimônio do clube



O Cartório de Registro de Imóveis confirmou que a escritura foi lavrada, mas a reportagem não conseguiu informações sobre o recolhimento de ITBI. É que há mais de um ano a prefeitura e os cartórios não autorizam a lavratura de escrituras pelo valor venal estipulado pelo setor de lançadoria.

É provável, entretanto, que Otacílio pagou o tributo pelo valor venal, conforme consta na ficha cadastral do imóvel na prefeitura de Santa Cruz. O documento já está em nome do prefeito e o valor venal do imóvel está fixado em R$ 292.085,45. Em 2018, na tribuna da Câmara, Otacílio disse que quem tenta passar uma escritura pelo valor venal certamente estaria fazendo uma “lavagem de dinheiro”. Ele ainda disse que esta atitude seria própria de “ladrões, sonegadores e corruptos”.



“Bacia das almas”

A suspeita de improbidade administrativa está no fato de o prefeito supostamente “forçar” a dissolução do antigo clube de olho na compra de seu patrimônio. Afinal, se a área contígua, onde está o campo de futebol, foi retomada pelo município, a compra do restante seria interessante para a prefeitura implantar algum projeto.

Mas há outras suspeitas. O valor da transação, R$ 295 mil, é considerado muito baixo no mercado imobiliário. Isto significa que Otacílio pode ter inviabilizado o clube e depois, adquirido o patrimônio remanescente “na bacia das almas”, como se diz no jargão do mercado imobiliário. Foi, sem dúvida, um negócio extremamente vantajoso, com uma “ajuda” do governo.

Em fevereiro de 2020, por exemplo, provavelmente no período em que o negócio foi oficializado e pago, três renomadas imobiliárias de Santa Cruz do Rio Pardo assinaram avaliações do imóvel do antigo BAC em valores muito superiores, respectivamente R$ 500 mil, R$ 532 mil e R$ 560 mil.

A própria prefeitura de Santa Cruz, conforme protocolo registrado em cartório em 2015, avaliou a construção da sede social do BAC em R$ 709.461,50 para fins de emolumentos. Diz o documento que o prédio foi construído em 1984 e ampliado em 1992, perfazendo um total de 504 metros quadrados de área edificada. Hoje, o valor deve ser maior, uma vez que o ITBI era menor na época.

Em março deste ano, Otacílio descartou a hipótese de ter desvalorizado o BAC ao retomar a área pública anexa à sede social. “Se eles resolveram vender, colocaram preço e estava à venda para qualquer pessoa e eu comprei, por que eu não posso ser o comprador? Quem desvalorizou a propriedade foram eles, que abandonaram aquele patrimônio, desvalorizando a propriedade”.

Na ficha cadastral da prefeitura, a propriedade do imóvel foi alterada em 2020 para constar o nome do novo dono, Otacílio Parras. O documento descreve que a situação de conservação do prédio do antigo clube é “ótima”. 



  • Publicado na edição impressa de 27 de setembro de 2020


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