Luiz Antonio Sampaio Gouveia

Sem preconceito

Coluna de Luiz Antonio Sampaio Gouveia

Sem preconceito

Publicado em: 04 de agosto de 2023 às 01:37

José Celso Martinez Correa, um porra louca que trouxe o público para os palcos do teatro brasileiro, disse que morria feliz porque vivera e morria viado. Zé Celso era de Araraquara, a Morada do Sol, na língua de meus antepassados tupiniquins, que meu padrinho de lá, o Remo Opice, dizia ser a Morada do Sór (que delícia ser caipira, como nós, icaiçaras, caipiras da beira do rio, como nos denominou o famanaz Professor Wilson Gonçalves, de quem já nos foram o Ubirajara e o Ubirani, para dar o nome do Icaiçara Clube).

É verdade que o Freud fala da fase anal de todo ser humano, mas se a tive, tive-a bebê. Depois fui andando pela vida, até o regaço amoroso de minha mulher, o único que tenho hoje, sempre amando outras, no plural, antes dela. Mas quando era moleque, tinha um amigo cujo pai tinha um barco no Iate Clube de Santos, que, aliás, fica no Guarujá, cujo marinheiro, era um monstro de forte e gay. De noite, no mar, a gente tirava sarro dele e ele revidava, zombando, cuidado, tesão emigra, como o Freud pensava também.

Como meu avô, nunca tive nada contra estes caras, desde que deem o que seja deles e não queiram o que é meu. Tudo bem! Mas os respeito, como uma tia os respeitava, que recebia, em casa, o Silas, célebre homossexual de Ipaussu, cidade que mudou de nome, por obra de minha tia, para tirar o çu e onde o velho Silas nunca negava fogo com a moçada. Sem falar no Luís de Saia, o nosso Madame Satã, cozinheiro da mãe do Tonico Lista. Que dizia um tio, bom de briga, em sua antiga juventude em Santa Cruz, que, no racha, somente tinha medo do Luís de Saia, porque este personagem apanhava de ninguém e era sobretudo muito valente.

Admito o progresso jurídico social que a jurisprudência brasileira faz para integração

à toda sociedade brasileira, da diversidade humana, coisa que busca a eliminação de preconceitos, que, em minha família nunca houve, pois na sala de meu avô, sentavam-se os mais altos dignatários da Igreja Católica Apostólica Romana, o Bispo de Maura, Dom Carlos, fundador da Igreja Católica brasileira, que, com o concurso de meu avô, trouxe os Dominicanos para Santa Cruz do Rio Pardo, o Governador Adhemar de Barros, o Senador Lino de Matos, todos os intelectuais santa-cruzenses, de renome nacional, como o Zézinho Camarinha, o Teófilo de Queiroz Jr., Doutor Samuel e todos os médicos que passaram por Santa Cruz, advogados, como Pedro Sampaio Doria, Pedro Camarinha, Caxixo, Doutor Omar, Biju, Lulu Camarinha e Ciro, Carlos Queiroz, o Embaixador Macedo Soares e o Coronel Cunha Bueno e sua esposa, a fascinante Dona Sebastiana, que fora farmacêutica em Santa Cruz, cunhada do seu Camargo, farmacêuticos de meu avô e pouco depois, a siá Nocência, preta de antiga escravatura e parteira de meu avô, que era médico obstetra e doutor, por título conquistado há mais de 100 anos, na velha academia da Bahia, além de todos os do São José e da Estação, que era onde, por aqui, moravam os afrodescendentes carentes de sua medicina, sempre gratuita. Logo depois, aparecendo a comadre portuguesa, mãe do Bulota e o Zé da Gruta, todo dia,  ali, da siá Rita, santinha de minha mulher, que minha vó foi quem manteve essa senhora, símbolo do amor do povo de Santa Cruz, embora ela, Dona Lisuca, seja omitida, certamente por descuido, em referências que se fazem à Ritinha Emboaba e cuidado dela de todos os dias e noites.

Assim, passei minha infância na Casa do Largo da Igreja, hoje Restaurante Casarão, onde meu avô fazia a troca do pavilhão nacional, em seu antigo quintal, declamando Castro Alves. E eu assistia criança em companhia de seu jardineiro, o Mario Bulota. Passei desta forma minha infância em respeito a todas as diversidades, sem conhecer preconceitos, embora me escondesse do Dito Carlos, um tabelião de Santa Cruz, que quando menino, me chamava baiano, com muita algazarra, gritando pela rua a fora, porque esta era a origem de meus avós maternos, a ver meu avô talvez de ascendência paulista migrada antes para a Bahia, como pesquiso, de um famoso padre.

Daí escrever sobre viado porque me choca Jean Willys, homem sexual, afrontar o digníssimo senhor Governador do Rio Grande do Sul, por sua respeitosa e respeitada homossexualidade, pública, muito discreta. Logo, João Willys, que, no passado, chamariam de viado, chibungo, e hoje respeitosamente, como deve ser, homossexual, quase Ministro do Napoleão do Agreste, o nosso Presidente Luiz Inácio.

Não bastasse ter me entristecido com o evento, envolvendo a homossexualidade aí, de nossa terra. Mas tenho certeza que a grandeza de Celso Vilardi, meu amigo e orientador na Fundação Getúlio Vargas, com sua peculiar eficiência, buscará o melhor Direito, para solucionar com Justiça a questão. 


Luiz Antonio Sampaio Gouveia

Luiz Antonio Sampaio Gouveia

Santa-cruzense, Sampaio Gouveia é advogado graduado pelas Arcadas e especialista em Finanças e Contabilidade (pela EAESP/FGV) e em Direito Penal Econômico (pela GVLAW/FGV), mestre em Direito Público (Constitucional) pela PUC-SP, Conselheiro e Orador oficial do IASP, membro do Consea/Conjur/Fiesp, procurador-jurídico da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, entidade em que é irmão Mesário e remido, conselheiro da Fundação Arnaldo Vieira de Carvalho, mantenedora da Faculdade de Medicina da Faculdade de Misericórdia de São Paulo. É membro do Instituto Brasileiro de Recuperação de Empresas em Crise. Foi conselheiro-seccional da OAB-SP e da ASP. CEO Sampaio Gouveia Associados


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