O médico psiquiatra Eduardo Ursolino, hoje em Santa Cruz do Rio Pardo, após entrevista ao jornal em seu consultório
Publicado em: 16 de julho de 2022 às 03:35
André Fleury Moraes
O estigma em torno da psiquiatria está passando, e cada vez mais as pessoas entendem o seu papel enquanto especialidade médica.
Quem diz é o médico Eduardo Ursolino, nascido e formado em Presidente Prudente-SP, com passagens profissionais em Porto Alegre-RS e também pela capital paulista.
Há alguns anos ele adotou Santa Cruz como seu local de trabalho. Começou na rede pública, e logo percebeu que veio para ficar. Se apaixonou pela antiga “Joia da Sorocabana” e decidiu abrir a própria clínica, a Vivamente, no centro da cidade.
Em entrevista ao DEBATE, Ursolino admite ter notado um aumento expressivo nos quadros de transtorno mental — sobretudo agora, no período pós-pandemia, que se soma a um cenário de crise econômica. Diz, entretanto, acreditar em dias melhores num futuro a curto prazo.
A seguir, os principais trechos da conversa.
*
Estamos vivendo um momento delicado, o pós-pandemia, que se soma a uma crise econômica. Muita gente se queixa de desânimo, algo que deve se refletir nos seus pacientes. O que o sr. nota que está evidente neste período?
Tivemos uma mudança muito drástica no estilo de vida das pessoas. Uma verdadeira ruptura no relacionamento entre as pessoas, causada pelo isolamento social. Em seguida veio o agravamento da crise econômica.
Tudo isso gerou um medo do amanhã. As pessoas passaram a sentir preocupação com a Covid, insegurança com a renda familiar. Um conjunto de fatores cuja consequência foi um grande impacto na saúde mental das pessoas. E um impacto negativo, que desencadeia ansiedade e depressão de maneira geral.
Esse adoecimento generalizado, na sua avaliação, pode ser revertido a curto prazo?
Acredito que sim. Mas isso depende de alguns fatores. Um deles já está acontecendo, que é a redução na taxa de mortalidade da Covid-19. Não temos mais três ou quatro mil mortes diárias, e isso leva um certo alívio às pessoas, que se sentem mais confortáveis para retomar a vida que levavam antes da pandemia. Nesse sentido, as vacinas foram fundamentais.
Mas não é a única coisa. Dependemos também de uma estabilização da economia para levar segurança à renda das famílias.
Esse conjunto pode reverter o desânimo que presenciamos hoje. Mas não significa que todos serão beneficiados. Uma parcela da população deve permanecer traumatizada por um período maior, uma espécie de “sequela” da sequência de momentos ruins, e precisa procurar apoio.
É evidente, então, que a saúde mental das pessoas piorou. O que o sr. nota nos seus pacientes?
Vejo um aumento expressivo nos quadros de ansiedade, que se tornou queixa praticamente predominante. Mas também há mais incidência de depressão e estresse pós-traumático. E também há aqueles que, apesar do sofrimento, não buscaram ajuda ainda. Por isso, a identificação dos sintomas é fundamental para retomar uma mente saudável. Nos primeiros sinais de ansiedade ou depressão, que podemos notar quando o problema se torna recorrente, um apoio profissional é necessário.
O sr. atende na rede pública e na rede particular. São pacientes com condições econômicas geralmente distintas. Quais as diferenças dos quadros que apresentam?
O paciente da rede pública se queixa muito de insegurança financeira. Existem contas para pagar, dívidas, entre outras coisas. Eles são mais propensos a ter uma saúde mental instável, e isso acontece por muitos fatores — como falta de acesso à Educação, Cultura e lazer de qualidade.
Claro que não é o único motivo, mas uma vida financeiramente estável ajuda a manter a saúde mental em dia. Há também o fator familiar, que muitos pacientes apontam.
Existe um tabu muito grande em torno dos transtornos na saúde mental. Algumas pessoas desacreditam a depressão, por exemplo, dizendo que a pessoa é preguiçosa.
Isso é verdade. Claro que ocupar a cabeça ajuda a manter a mente saudável, mas não é a única coisa a ser feita em casos de transtornos. Podemos atuar na prevenção, por exemplo. Uma rotina bem definida, aliada à prática de exercícios físicos e uma alimentação adequada, melhora o sentimento de bem-estar da pessoa.
Outro ponto sensível são os medicamentos, vistos como “vilões” no tratamento. Qual o papel da Psiquiatria neste ponto?
Existe o estigma de que quem vai ao psiquiatra é louco. Hoje isso melhorou, até porque o avanço da tecnologia deixou a rotina das pessoas muito mais acelerada. A ansiedade tomou conta da população.
A Psiquiatria ganhou seu espaço como especialidade médica. Todos estamos sujeitos a precisar de algum medicamento em alguma situação da vida.
Isso não retira, porém, o papel dos psicólogos, que são essenciais no tratamento do paciente. A ajuda profissional deve ser conjunta.
Voltar ao topo