O MENTOR — Paulo Roberto de Andrade, o “Crica”, foi o fundador das “Fazendas Reunidas Boi Gordo”
Publicado em: 13 de novembro de 2021 às 03:15
Atualizado em: 13 de novembro de 2021 às 03:17
Sérgio Fleury Moraes
A decisão judicial que concordou em levar a leilão várias propriedades do escândalo da “Boi Gordo” pode finalmente colocar um ponto final na polêmica que se arrasta há 17 anos. São várias fazendas que teriam sido adquiridas num esquema de “lavagem de dinheiro” após vários bens terem sido desviados e os recursos enviados ao exterior, sendo repatriado para a compra destas propriedades. As informações foram publicadas na semana passada pela revista “Veja”.
No mês passado, a 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo afastou os últimos recursos que tentavam impedir que bens de empresas envolvidas no caso tivessem seus bens arrolados no processo.
A ação, que teve o apoio do Ministério Público, investigou cerca de oitenta propriedades rurais localizadas nas regiões Nordeste e Centro-Oeste, que agora vão a leilão para ressarcir uma parte de um prejuízo gigantesco de R$ 6 bilhões que lesou cerca de 32 mil pessoas.
Este novo patrimônio foi descoberto após a falência da Boi Gordo, decretada em 2004, e não integrava a massa falida que leiloou 17 fazendas entre 2017 e 2018. A primeira operação arrecadou R$ 540 milhões, que pagou uma parte dos prejuízos de credores membros da “Associação dos Lesados pela Boi Bordo”.
As outras fazendas foram compradas com dinheiro ilícito, segundo apurou o Ministério Público, numa operação que envolveu ex-policiais federais. Eles percorreram oito estados brasileiros e descobriram que offshores americanas repassaram este dinheiro ao Brasil para a compra das propriedades. O dinheiro, entretanto, foi desviado dos credores.
O esquema começou a ruir quando o santa-cruzense Paulo Roberto de Andrade, idealizador da “Boi Gordo”, pediu concordata em 2001. Dois anos depois, ele vendeu a empresa a dois grupos financeiros — Golin e Sperafico —, que nomearam como gerente um tal de José Roberto da Rosa.
No entanto, entre a venda e a falência, que foi decretada em 2004, muitas fazendas “desapareceram”, juntamente com milhares de cabeças de gado e até sêmen ou embriões.
Só então a Justiça descobriu que José Roberto da Rosa simplesmente não existia e que o personagem fora “criado” a partir de documentos falsos. Investigações constataram, ainda, que as assinaturas do suposto gerente eram feitas por um contador da Golin. O “fantasma” movimentou mais de R$ 1 bilhão em bens e dinheiro.
Na época, o Ministério Público do Estado agiu e descobriu toda a movimentação financeira para desviar os imóveis da empresa. “Houve um desvio brutal de bens da Boi Gordo. E nada dessa movimentação de bens entrou no caixa da Boi Gordo nem foi formalizado perante a Junta Comercial”, afirmou na ocasião o promotor de Falências do Ministério Público de São Paulo, Eronides Santos.
Todos estes bens, então, foram bloqueados. De acordo com as investigações, a venda de ativos da “Boi Gordo” foi fraudulenta, com os recursos enviados para o exterior e posteriormente retornando ao Brasil através de lavagem de dinheiro com a compra das fazendas. As propriedades agora vão a leilão. Elas foram avaliadas em R$ 2 bilhões, mas devem render R$ 600 milhões nos leilões.
A ”Boi Gordo” surgiu nos anos 1990 com uma forte campanha publicitária prometendo lucros milionários aos investidores. Os anúncios na televisão eram protagonizados pelo ator Antonio Fagundes, na época o galã da novela “O Rei do Gado”. Milhares de brasileiros compraram títulos da empresa, entre eles o próprio Fagundes e outros artistas de televisão, empresários e jogadores de futebol, além de muitos investidores de Santa Cruz do Rio Pardo.
O dono, o santa-cruzense Paulo Roberto de Andrade, o “Crica”, também participou de campanhas publicitárias. No final da década de 1990, ele foi um dos indicados para receber o prêmio “Empresário do Ano”, concedido pelo jornal “Gazeta Mercantil”.
A empresa chegou a negociar ações na Bolsa de Valores, mas só depois se descobriu que tudo não passava de um esquema de pirâmide, ou seja, os novos investidores pagavam os lucros dos demais. Quando quebrou, a “Boi Gordo” deixou um rastro de R$ 6 bilhões em prejuízos.
Paulo Roberto de Andrade sumiu a partir de então. Entre aqueles que perderam dinheiro com a “Boi Gordo” estão os artistas Marisa Orth, Antonio Fagundes, Hans Donner, Erasmo Carlos e o escritor Benedito Ruy Barbosa, além de jogadores como Vampeta, Marcelinho Carioca, Edilson, Evair e até o técnico Luiz Felipe Scolari.
O golpe, entretanto, não levou ninguém para a cadeia. Em 2009 o STJ (Superior Tribunal de Justiça) julgou a prescrição do processo por estelionato contra Paulo Roberto de Andrade. Restaram, então, as ações civis que buscam o ressarcimento dos valores investidos na “Boi Gordo”.
Porém, a mídia investigou o passado do santa-cruzense Paulo Roberto de Andrade e descobriu que ele havia sido preso nos anos 1960 por assalto a mão armada, cumprindo pena de quatro anos de prisão.
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