Padre Gustavo Trindade dos Santos é réu por homicídio qualificado
Publicado em: 10 de agosto de 2023 às 23:55
Sérgio Fleury Moraes
O frei Gustavo Trindade dos Santos, acusado de ter atropelado propositalmente um homem que realizou pequenos furtos na Casa Paroquial em maio do ano passado, vai recorrer da decisão da Justiça de Santa Cruz do Rio Pardo que determinou a convocação do Tribunal do Júri para o julgamento do religioso. O atropelado, Ângelo Marcos dos Santos Nogueira, morreu pouco mais de dois meses após o acidente.
A sentença de pronúncia, que é a determinação do juiz para que o crime seja julgado por um júri popular, saiu em março deste ano. O frade dominicano foi denunciado pelo Ministério Público como incurso no artigo 121 do Código Penal, que estabelece os crimes contra a vida e quando o réu assume o risco ou quis este resultado.
Acusação é de homicídio qualificado, cuja pena pode chegar a vinte anos de reclusão. Entretanto, a pena pode ser ampliada caso os jurados entendam que há qualificadoras para o crime. O juiz Pedro de Castro e Sousa deixou a decisão sobre as qualificadoras para o júri popular.
Ex-pároco da Igreja Matriz de São Sebastião, o padre Gustavo Trindade dos Santos atropelou Ângelo Marcos na noite de 7 de maio do ano passado, logo após a celebração de um casamento. Avisado de que a Casa Paroquial, a poucos metros da igreja, estava sendo furtada, ele se dirigiu ao local e viu um vulto pulando o muro da propriedade.
Gustavo pegou o carro da igreja e passou a perseguir o suspeito pelas ruas próximas da Igreja Matriz. Na avenida Tiradentes, perto de uma loja de tintas, o religioso invadiu a calçada e jogou o automóvel – um Chevrolet Cobalt – contra o homem. O carro arrebentou o portão de uma garagem e esmagou o suspeito contra um caminhão que estava no interior.
Ângelo, conhecido por “Anjinho”, era dependente químico e já havia sido condenado por pequenos furtos. No dia do atropelamento, ele havia furtado algumas peças de roupa da Casa Paroquial. Toda a ação, inclusive a perseguição do padre pelas ruas do entorno da Igreja Matriz, foi filmado por câmeras de monitoramento. O suspeito carregava nas mãos algumas peças de roupa.
Em estado grave, Ângelo permaneceu vários dias na UTI e morreu no dia 27 de julho do ano passado, por complicações decorrentes do atropelamento.
Logo após atropelar o ladrão da Casa Paroquial, o frei Gustavo abandonou o local sem prestar socorro ao homem. Horas depois, com um outro automóvel da Escola Dominicana, o religioso abandonou Santa Cruz com destino à região de Bauru.
A perícia da Polícia Civil constatou que o religioso não freou o automóvel ao invadir a calçada. A Justiça negou por duas vezes o pedido de prisão do padre. A investigação também descobriu que o padre levava um aluno da Escola Dominicana como passageiro.
Na primeira vez em que foi interrogado pela Polícia Civil, Gustavo Trindade dos Santos negou estar arrependido e narrou uma versão diferente daquela mostrada pelas câmeras de monitoramento. Ele disse que o suspeito “se jogou” contra o capô do automóvel e que, pouco antes, gritou várias vezes para o homem parar, através do vidro entreaberto.
Em juízo, porém, a versão do religioso mudou. Ele disse que invadiu a calçada numa tentativa de “obstruir” o caminho da vítima e que o fato deve ser configurado como “acidente”. Gustavo ainda afirmou que “não conseguiu frear” o veículo, provavelmente porque estava com um celular na mão enquanto dirigia.
Ele também admitiu que não se lembra de ter abaixado o vidro e nem se conversou com alguém. Ao contrário do primeiro interrogatório, o padre também disse não se lembrar se a vítima caiu sobre o capô do automóvel. Pela primeira vez, ele também disse que estava “muito arrependido” de sua própria conduta.
Na primeira manifestação contra a sentença de pronúncia da Justiça de Santa Cruz, a defesa do padre Gustavo Trindade alegou que ele agiu de forma imprudente, pedindo o afastamento da acusação de homicídio qualificado. “O acontecimento foi um acidente e que, por grande infelicidade, levou a óbito a vítima”, diz trecho da petição, que pede a mudança de tipificação do fato como “homicídio culposo na direção de veículo automotor”, previsto no Código de Trânsito Brasileiro.
A Justiça de Santa Cruz do Rio Pardo negou o recurso, mas os advogados do padre recorreram ao Tribunal de Justiça, que ainda não marcou uma data para o julgamento do pedido. Enquanto isso, oficiais de Justiça têm relatado dificuldades para notificar o réu. Em junho, um oficial relatou que o padre está residindo no Rio de Janeiro.
A mãe de Ângelo Marcos também ajuizou uma ação indenizatória pela morte do filho. Além do próprio autor do atropelamento, o frei Gustavo Trindade, a Diocese de Ourinhos também entrou no processo como responsável solidária, uma vez que é proprietária do automóvel cedido ao padre.
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