Publicado em: 13 de novembro de 2021 às 03:33
Atualizado em: 18 de novembro de 2021 às 19:41
Sérgio Fleury Moraes
Imagine ver todos os dias espécies coloridas de pássaros como pica-pau, sabiá, bem-te-vi, sanhaço, rolinha, pombinhas, tietê e vários tipos de canários, todos livres e voando pelas árvores. Pois este é o deslumbrante cenário que o empresário santa-cruzense Sirineu Batista, 69, acompanha todas as manhãs na praça São Sebastião, no centro de Santa Cruz do Rio Pardo. Há quase dois anos, ele alimenta e dá água aos pássaros que dividem espaço com estudantes e praticantes de caminhadas.
“Neu”, como é conhecido, mantém esta rotina também aos sábados, domingos e feriados. “Eu só me ausento quando estou pescando”, diz o empresário, amante da natureza e dos animais. Ele admite que já teve pássaros domésticos em gaiolas, mas abandonou a prática há alguns anos em nome da liberdade das aves. E também porque a mulher, com quem é casado há 47 anos, não gosta. “Minha mãe criava passarinhos e foi aí que comecei a gostar deles”.
Nas férias, quando parte para pescarias, geralmente em rios do Mato Grosso, “Neu” diz que fica preocupado com os pássaros da praça São Sebastião. “Eu fico imaginando como eles sentem a falta dos alimentos, já que não vi ninguém fazendo o mesmo nestes dois anos”, diz.
Em sua oficina que abriga carros especiais, o empresário possui um saco enorme de quirela, um alimento fabricado com restos de milho ou mandioca especialmente para pássaros. “Neu” trabalha com venda de carros especiais, especialmente peruas Kombi que são restauradas e vendidas para o exterior.
Mas o “hobby” tem um custo. Além de “financiar” a quirela, o santa-cruzense costuma comprar frutas nos mercados para reforçar a alimentação dos pássaros da praça. São bananas, maçãs, mamões e abacates. “Não fica muito barato, mas vale a pena”, garante. O quilo do abacate, por exemplo, está beirando R$ 10.
No entanto, “Neu” conta que ficou chateado com um supermercado da cidade que não quis dar desconto no preço de frutas em condições próximas a do descarte. “Eu queria pagar, mas um preço menor, e a gerente disse que aquele mamão seria dado em troca para o fornecedor. Nem contei o motivo pelo qual queria a fruta, mas deixei de ser cliente do supermercado”, disse.
Além de adorar passarinhos, “Neu” tem outro motivo para ir todas as manhãs na praça São Sebastião. “Eu acordo muito cedo, geralmente logo depois das 5h”, lembrou. “E gosto de ouvir os passarinhos nesta praça, pois eles aumentaram muito nos últimos anos, e aí pensei que também poderia alimentá-los. E não parei mais”.
A quirela é jogada no chão, em espaços próximos a algumas árvores. Em minutos, surge uma aglomeração de aves disputando os pequenos grãos.
A proliferação das espécies acontece por motivos tradicionais — a época do ano, em plena primavera, quando as ninhadas começam a voar —, mas também devido a problemas com o Meio Ambiente. Segundo o veterinário Kaio Sérgio da Venda, o desmatamento e o aumento das pastagens contribuíram para o aparecimento de vários tipos de aves nas áreas urbanas.
“Além disso, o próprio crescimento da cidade é responsável pela presença desses pássaros. Na verdade, nós invadimos o espaço deles e, em consequência, eles também entraram na área urbana. E o interessante é que eles se comunicam, avisando os outros sobre a presença de comida”, conta Kaio Sérgio. Ele disse, por exemplo, que há vários tucanos morando em bairros da cidade.
Os pássaros, aliás, se habituaram com a presença das pessoas na praça. Claro que ninguém consegue chegar muito perto, mas eles ficam tranquilos a poucos metros dos humanos.
“Neu” Batista disse que ficou surpreso ao ver pica-paus se alimentando das frutas que deixa num cocho especial pendurado numa árvore. “Que eu saiba, este tipo de pássaro se alimenta de insetos. Mas eu os vejo devorarem as frutas”, contou. Na verdade, algumas espécies de pica-paus comem de tudo, desde insetos a frutas ou seiva de árvores.
O cocho de frutas que Batista levou à praça, aliás, é disputadíssimo. Feito com um longo pedaço de bambu, ele provoca até brigas entre os pássaros, especialmente quando um bem-te-vi aparece. Esta espécie, segundo “Neu”, gosta de tomar conta do espaço. “Ele toca todos os outros, como se fosse o dono do pedaço”, brinca. O canário-da-terra é outro pássaro que não gosta de concorrentes.
O empresário também fabricou bebedouros, feitos a partir de garrafões de água ou tampas plásticas, que são colocados no centro da praça São Sebastião. É o local onde os pássaros tomam banho, geralmente durante as manhãs. Porém, é comum aparecerem cães que costumam frequentar a praça e usar os bebedouros. “Tem espaço para todo mundo. O problema é que os cachorros às vezes bebem muita água, dificultando depois o banho dos passarinhos”, conta.
É neste cenário, durante as manhãs na praça São Sebastião, que Sirineu “recarrega” as baterias para mais um dia de trabalho. A natureza — e os frequentadores do espaço público — agradecem.
* Colaborou Toko Degaspari
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