‘Miss Comerciária’: concurso da ACE volta e terá candidata trans

Sérgio Fleury Moraes

A 9ª edição do concurso “Miss Comerciária” será realizada em agosto pela Associação Comercial e Empresarial (ACE) de Santa Cruz do Rio Pardo. A escolha vai acontecer numa solenidade de gala nos salões da associação – no prédio do antigo Clube dos Vinte – na noite de 20 de agosto. Nos dois últimos anos o evento foi cancelado por conta da pandemia da covid-19.

Em 2022 a grande novidade será a participação da primeira candidata trans da história de Santa Cruz do Rio Pardo. É Luana Spyller dos Santos, 30. No total, até a semana passada havia 13 candidatas ao título de “Miss Comerciária”, número oficial até a véspera do encerramento das inscrições.

Segundo Mara Araújo, gerente da ACE, embora o concurso tenha o nome de “comerciária”, o regulamento autoriza a participação de funcionárias de empresas do ramo de prestação de serviços e outros segmentos empresariais, bastando que elas sejam filiadas à entidade.

Além disso, a candidata teve ter até no máximo 30 anos e ter registro em carteira ou um contrato com a empresa contratante. “Nós percebemos que já existe uma grande expectativa na retomada do concurso neste ano. Afinal, é um dos principais eventos da ACE, um dos mais bonitos e também mais trabalhosos”, disse.

Mara admitiu que a participação de uma trans é um marco na trajetória do concurso. “Ela precisou se adequar ao regulamento e, por isso, providenciou o nome social e a troca de todos os documentos”, explicou.

Com o fim das inscrições, a partir da próxima semana a ACE vai providenciar os cartazes para a divulgação do evento e iniciar os ensaios das candidatas. A entidade firmou uma parceria com a Okthos para treinamentos de dança, desfile e posicionamento na passarela. “É um evento importante na vida das candidatas, uma experiência marcante. No entanto, a maioria não tem noção de desfile, daí a necessidade dos ensaios. Eles servem para afastar até mesmo a inibição de muitas candidatas”, afirmou.

Haverá prêmios extras, como um troféu para a torcida mais animada, que pode participar do evento até com faixas. “É realmente um concurso muito glamouroso, com as candidatas se apresentando em vários trajes, desde o maiô até a roupa de gala”, disse Mara.

A ACE também firmou parcerias com outras empresas, como cabeleireiras, para a preparação do look das candidatas. Além disso, vai oferecer prêmios em dinheiro, uma viagem à Camboriú/SC, cursos de idioma e vários brindes. A “Miss Comerciária” eleita vai receber R$ 1 mil e a viagem ao litoral de Santa Catarina. Também serão eleitas duas princesas e uma “Miss Internet”, com votação aberta ao público.

Toda candidata a “Miss Comerciária” terá um lote de convites para vender a R$ 20,00 a unidade. O público será limitado, mas qualquer pessoa pode participar adquirindo um ingresso avulso na própria ACE. No dia do evento, haverá shows de dança e música no salão da ACE, além da presença da “Miss 2019”, Michele Machado, que concorreu pela Editora Viena na última edição do concurso.

Luana Spyller dos Santos, 30, é a primeira trans a participar do concurso de “Miss Comerciária” de Santa Cruz do Rio Pardo. Para se adequar ao regulamento, ela precisou deixar de adiar a transição para o gênero feminino. Luana trocou todos os documentos, desde a certidão de nascimento, e se tornou oficialmente uma mulher.

Nascida em Taquarituba, ela conta que nunca teve problemas de preconceito em sua família. “Mas enfrentei na cidade em que morava. Já estou em Santa Cruz há dez anos e sinto que a cidade me abraçou. Nunca sofri nenhum preconceito no município”, disse.

Casada há cinco anos, ela é colaboradora do supermercado “São Lázaro”, no bairro Morada da Ponte Nova, e também auxiliar da agência de viagens “Tavares Turismo”. Ela vai competir no concurso pelo supermercado e elogia os empresários e a própria família pelo respeito. “Amor e carinho precisa vir primeiramente de pai e mãe. Além disso, os donos do supermercado deram total apoio”, diz.

Luana diz que viu a publicação da ACE sobre o concurso “Miss Comerciária” e, além de curiosa, ficou com vontade de participar. “Contei para a minha patroa, Lucimar, e ela incentivou a me inscrever”, conta. O problema era a falta de documentos femininos.

Na verdade, Luana Spyller tinha planos de mudar os documentos, mas sempre adiava qualquer iniciativa. Foi, então, que resolveu providenciar tudo. “Serviu como um empurrão para fazer isto. Tive o apoio de minha madrinha, que mora nos Estados Unidos, e ela pagou todos os custos. Afinal, esta mudança custa um bom dinheiro”, explicou.

A partir do protocolo, Luana ficou ansiosa para receber os novos documentos. Ela contou que a mudança só é autorizada se a pessoa provar que não tem antecedentes e nem nome sujo. “Não é fácil, mas foi uma conquista que o concurso possibilitou”, comemora.

Segundo ela, a participação no concurso pode ser um exemplo para a sociedade. “Todo mundo tem de correr atrás de seus sonhos. Estar concorrendo é uma conquista enorme, pois ganhar não importa muito. Acho que minha presença também significa que nós queremos respeito”, afirmou.

Luana diz que passou a sentir a responsabilidade de ser a primeira trans de Santa Cruz a participar do concurso a partir de um vídeo que um amigo publicou na internet, anunciando sua inscrição.

“Gente que eu nem imaginava está me incentivando. Eu estou mais comunicativa e alegre, além de orgulhosa por representar minha empresa”, disse. “E já estou até começando a tremer”, brincou.