Há 20 anos Nelson possui uma vaga no ponto de táxi da rodoviária de Santa Cruz, mas já passou por outros espalhados pela cidade
Publicado em: 21 de fevereiro de 2023 às 17:41
Sérgio Fleury Moraes
O taxista Nelson Costa Ribeiro não tem planos de se aposentar. Ele é o mais antigo taxista de Santa Cruz do Rio Pardo ainda em atividade e acaba de completar 50 anos de profissão. Aos 71 anos, Costa ingressou no ramo quando tirou férias na agência do antigo Banco Mercantil — cuja sede era no prédio da atual Casas Bahia — e resolveu apostar num negócio mais lucrativo. Até então, era contínuo do banco.
“Eu estava há um ano e meio no banco, primeiro como guarda e depois como contínuo. Mas eu queria ganhar um pouco mais e percebi que, naquela época, o táxi era importante. Batizados, casamentos, compras em mercado e viagens até propriedades rurais eram feitas através do taxi”, conta.
Era o início dos anos 1970 e não existia mototáxi e nem ônibus circular em Santa Cruz do Rio Pardo. Além disso, a população rural ainda era muito grande. “E era difícil um sitiante ter carro. Todo mundo recorria aos táxis”, lembra.
O carro pioneiro foi um Fusca, em 1973. O primeiro ponto de Nelson Costa ficava na rua Marechal Bitencourt, em frente à pensão Nossa Senhora Aparecida. “Éramos em sete carros naquele ponto. Depois, passei para o ponto da praça de São Benedito”, contou.
Na época, segundo ele, havia pontos de táxi espalhados por toda a cidade — na praça dos Expedicionários, na Igreja Matriz de São Sebastião, na pensão do Luiz Martelozzo, praça Octaviano Botelho de Souza, Ginásio de Esportes e praça Leônidas Camarinha. Em média, cada ponto tinha sete carros. “E todos trabalhavam sem parar”, lembra.
O Fusca pioneiro de Nelson era ano 1970 e praticamente um veículo impróprio para taxista, uma vez que só tinha duas portas. “A gente tirava o banco dianteiro do passageiro para facilitar”, disse.
Mas quando começou a ganhar um pouco mais, Nelson comprou um Volkswagen 1.600, que ficou conhecido no mercado automobilístico como “Zé do Caixão”. Mas era mais espaçoso e tinha quatro portas. “Meu trabalho aumentou, era dia e noite transportando gente”, conta o taxista.
Não existia telefone celular e o taxista precisava ficar ao lado do telefone do ponto, instalado num poste com uma caixa fechada. “Quem quisesse trabalhar bastante, tinha de ficar no ponto esperando o telefone tocar. Na época, eu já tinha telefone em casa e isto facilitava meus clientes”, disse.
Em sua trajetória, Nelson teve Brasília, Gol, Apolo, vários Fuscas e outros modelos. Foi quando o Governo Federal passou a isentar taxistas de alguns impostos. “Isto facilitou muito. Eu trocava de carro no máximo a cada dois anos, já que andava muito. Acho que tive uns 40 automóveis no total”, afirmou. Hoje, o táxi de Nelson é um Toyota Yaris.
O taxista garante que sempre manteve seus carros limpos, mas dia de casamento era especial. O automóvel ficava brilhando para transportar a noiva até a igreja. “Tudo era marcado com antecedência mínima de um mês. Eu tinha uma agenda para controlar casamentos ou batizados”, lembra.
Há 20 anos, Nelson atende no ponto da rodoviária. “É um local muito bom, pois as pessoas chegam de ônibus e precisam do táxi. O celular ajuda, pois tenho muitos clientes que me conhecem”, disse.
O taxista lembra da época em que Santa Cruz tinha prostíbulos. Até os anos 1970, estas mulheres andavam de charrete pelas ruas, mas depois passaram a chamar os táxis. “Se quisesse, dava para trabalhar a noite toda. Foi naquela época que surgiu a aposentadoria dos idosos e muitos gastavam tudo naquelas casas”, lembra.
Mas nem tudo foi alegria na profissão. Nelson Costa já foi assaltado duas vezes. Na primeira, o passageiro pediu para parar na rodovia que liga Santa Cruz a Ipaussu e anunciou o assalto. “Ele encostou um revólver e ameaçou me matar. Em seguida, me deu uma pancada e eu desmaiei por alguns minutos, enquanto ele procurava dinheiro e o celular. Acordei, consegui abrir a porta e correr. Por sorte, eu estava com dois celulares e avisei a polícia”, contou. O assaltante nunca foi preso e o carro, um Chevrolet Astra, foi encontrado dias depois em Piraju.
Na segunda vez, um passageiro pediu para fazer uma corrida até Bernardino de Campos. Pouco antes da entrada da cidade, ele perguntou o preço e começou a mexer no bolso. Foi quando tirou uma faca e avançou sobre o taxista. “Eu nem me lembro direito, mas levei a mão e quebrei a lâmina da faca. Mesmo ferido, eu ainda lutei contra ele, mas o ladrão conseguiu fugir com dinheiro. Pelo menos este foi preso pela polícia”.
Como diz o ditado, gato escaldado tem medo de água. “Hoje eu tenho mais cuidado. Se não conheço a pessoa ou desconfio de algo, dou uma desculpa para não fazer a corrida”, garante.
Em 50 anos, Nelson sofreu dois acidentes. No primeiro, ele descia a rua da Santa Casa quando um carro cortou a preferencial. “Não deu tempo e houve a batida. O motorista do outro carro era o frei José Maria Lorenzetti, que pediu desculpas e pagou todo o prejuízo”, lembra.
O segundo foi pior. Nelson dirigia uma Parati em direção a Piracicaba, durante uma noite chuvosa, transportando funcionários de uma empresa seguradora. “De repente, numa curva, tinha uma carreta parada em cima da pista. Não deu tempo e entrei debaixo dela. Eu tive alguns ferimentos, mas descemos do carro e percebemos que o motorista estava dormindo dentro da carreta. Ele deu partida e fugiu, arrastando a Parati por vários quilômetros, até ser parado pela polícia”.
Outra aventura de Nelson aconteceu em 1978, quando uma mulher telefonou e pediu uma corrida urgente para a Santa Casa, pois estava grávida e a criança, prestes a nascer. “Corri com o meu Fusca da vila Matias em direção ao hospital. A um quarteirão da Santa Casa, a bolsa estourou”, contou.
A criança nasceu na porta da Santa Casa de Misericórdia, dentro do táxi. “O médico e as enfermeiras atenderam a mulher no carro, pois não havia nem tempo para internação”, disse. Muitos anos depois, Nelson conheceu o jovem que nasceu em seu Fusca.
Nos anos 1980, com a chegada dos ônibus circulares e do mototáxi, o ramo sofreu um abalo. No entanto, os taxistas acabaram se adaptando ao longo dos anos, embora a frota em Santa Cruz ficou reduzida a pouco mais de duas dezenas de motoristas. “A moto leva um passageiro e o carro transporta até quatro. Neste caso, fica até mais barato”, avalia Nelson.
Voltar ao topo