CULTURA

Beto Magnani: 'O boi'

Beto Magnani: 'O boi'

Publicado em: 17 de dezembro de 2019 às 22:55
Atualizado em: 29 de março de 2021 às 07:54

HISTÓRIAS DO MAGÚ

O boi

Beto Magnani

Da Equipe de Colaboradores

Saiu todo mundo de repente de dentro de uma casa de portas largas. Largas mesmo; saíram uns cinco de cada vez. A calçada ficou cheia em três segundos. Instalou-se uma pequena aglomeração que interrompeu o caminho. Todo mundo falava com todo mundo e ninguém ouvia ninguém. Afoitos. Algo tinha acontecido. Um senhor ao meu lado, também com o caminho interrompido, disse que ali era uma academia de Muay Thai e que provavelmente todos eles ficaram sabendo ao mesmo tempo que o Silvio Santos morreu, talvez na hora em que a aula acabou e puderam olhar seus celulares. Disse ainda, serenamente, que era para eu ter paciência.

— O Silvio Santos morreu?! — não resisti, interrompi surpreso com a notícia, claro.



— Não. Tô dando um exemplo só. É que parece coisa do tipo. Sei lá o que aconteceu com essas pessoas. Mas eu sempre penso no Silvio Santos quando vejo agitação; fiz uma aposta com um amigo; apostamos quem vai dar a noticia da morte do Silvio Santos primeiro para o outro. Tá valendo uma viagem para a Itália para conhecer Assis. Nós vamos juntos, mas quem perder paga. E só vale se o outro ainda não estiver sabendo. Por isso que para ganhar tem que ser rápido. Tô sempre esperto.



— Sei. — foi o que consegui dizer, agora surpreso com o inusitado da aposta.



Atravessamos as pessoas e, ouvindo as conversas simultâneas, conseguimos entender que uma mulher tinha tirado a roupa no meio da aula por causa do calor e continuou os exercícios nua, como se nada tivesse acontecendo. Parece que todos começaram a rir e não conseguiram continuar. Saíram todos juntos para compartilhar o constrangimento. Alguns afirmavam se tratar de uma louca.

— Sei quem é essa senhora. Mora neste prédio. – continuou o senhor do Silvio Santos apontando a portaria do prédio vizinho à academia de Muay Thai — Ela também é devota de São Francisco.



Ajuda bastante na festa. Quatorze de março é o seu dia. É nessa data que um dia eu pretendo estar em Assis.



— Essa também é a data de aniversario do Einstein. É comemorado como dia da relatividade. — falei porque tinha acabado de ler isso num cartaz da churrascaria que eu acabara de almoçar.



— Os seguranças do prédio da frente a chamam de vaca do primeiro andar. São uns babacas que não tiram o olho da janela, esperando ela aparecer nua. — continuou o senhor, ignorando o Einstein.



— Então o senhor é devoto de São Francisco? — perguntei para mudar o assunto.



— Eu, ela e meu amigo. Sentamos juntos na igreja todos os domingos. Dia 14 de março é dia dos animais por causa do São Francisco de Assis.



— E dia da relatividade por causa do Albert Einstein. — Insisti.

— E agora dia do rodeio também. Acabei de ver no diário oficial.

— Como assim?

— Eu leio os diários oficiais todos os dias. É lá que a gente fica sabendo das coisas. Quando descubro algo que pode ser noticia aviso o meu amigo. O da aposta. Ele é jornalista. Ele aproveita tudo que eu descubro.

— E o senhor descobriu que o dia do rodeio é no mesmo dia dos animais e da relatividade?

— Pior. Descobri uma afronta ao São Francisco de Assis! Até à ele os idiotas querem provocar! Esta é a noticia. Celebrar o sofrimento do boi no dia dos animais? É uma ofensa!

— É. Poderia ser em qualquer outra data. — concordei.

— Não tem nem que comemorar. Maltratar é crime em qualquer situação. Sem concessão. Pode até matar pra comer, mas fazer o bicho sofrer é covardia. Das piores. E olha que comer a carne tá caro nos dias de hoje. Nem o Silvio Santos deve tá comendo mais.

Continuou andando sem parar de falar. Tentei me despedir, mas ele não deu espaço. Pensei em voltar para conhecer melhor a academia de Muay Thai, mas desisti. Virei a esquina.

(Magú) 



  • Publicado na edição impressa de 8/12/2019


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