CULTURA

João Zanata Neto: ‘Ovelha desgarrada'

João Zanata Neto: ‘Ovelha desgarrada'

Publicado em: 07 de fevereiro de 2020 às 21:59
Atualizado em: 29 de março de 2021 às 10:58

Ovelha desgarrada

João Zanata Neto

Da Equipe de Colaboradores

Parece impossível ou alguma coisa indecifrável. É isto que se diz sobre todos os mistérios. E nem se sabe se é um ou dois ou mais mistérios. É certo que estamos procurando algo que explique todas as nossas dúvidas, as inquietações do pensamento. Seria mais fácil encarar a vida com uma fé que não se questiona assim como escreveu Fernando Pessoa em “O apanhador de rebanhos”. Este desprezo do Pessoa pela filosofia traz um conforto para a alma. A simplicidade no humilde como a virtude que dispensa considerações sobre Deus foi a sua forma de contatar o criador diretamente sem intermediários e os seus dogmas. Pessoa tem um coração místico e entende-lo desta forma é possível perceber a profundidade desta narrativa metafórica. Ler “O apanhador de rebanhos” sem se ater ao simbolismo que a obra contém não se poderá alcançar a mensagem mística que o texto evoca.

O ser nasce e cresce no berço da ignorância. Não é atoa que a criança é perguntadora, pois tudo lhe é estranho. Conforme toma contato com o mundo, a estranheza se transforma no incompreensível. Isto é tão natural como o botão que só se percebe flor quando desabrocha na primavera da juventude. Nesta sua primavera o que era incompreensível se transforma em antagonismo e hipocrisia. Mas, não tardará para o mundo lhe remediar, apascentando a sua alma inquieta e revolucionaria.

Neste momento, os adultos hão de educar, entorpecendo-o com as crenças, dogmas, o materialismo científico e toda a sorte de ensinamentos e teorias que se fazem passar por verdades absolutas. Com muito orgulho relegamos aos jovens todas as nossas dúvidas como se fossem verdades. É assim que o ciclo da ignorância se perpetua.

Mas, um dia, a ovelha crescida há de se desgarrar, atravessando as fronteiras do conhecimento racionalizado. Lá fora, onde o livre arbítrio cobra novas escolhas, a ovelha desgarrada pode se perder nos espinhais do ateísmo ou pastorear os novos campos verdejantes da filosofia. Um mundo novo se apresentará ao pensamento desgarrado. Cada ovelha fugidia percorrerá um caminho diferente ou simplesmente retornará as suas crenças ou ao seu materialismo científico. Há outras ovelhas, no entanto, que não ousarão fugir, mas, viverão pensando no mundo lá fora. O velho saber é muito mais seguro mesmo que repleto de dúvidas. Contudo, o mundo, além das fronteiras da ignorância, possui trilhas ocultas que requerem guias para os iniciantes.

Uma ovelha desgarrada pode se fartar em novos campos de conhecimentos, mas quando estes se tornarem áridos, ela perceberá que ainda lhe resta inquietações. É natural que os desgarrados passem por mudanças em seu pensamento quando os velhos campos não mais alimentem as suas dúvidas persistentes. Muitos pensadores transitam entre as ciências, deixando as ciências da psique para o Espiritismo e desta para as ciências herméticas, pois não compactuam com o fanatismo e buscam o saber supremo. As ciências racionais exploram os seus limites, mas sempre tropeçam em seus paradoxos. Sustentar paradoxos é insistir no fantasioso onde toda a lógica é perdida. Todas as ciências racionais serão tentadas pelo infinito que as instiga como a dúvida suprema. É aí a resignação máxima do cientista quando se conforma com o que sabe e aceita o que não pode descobrir. É doloroso para ele resignar-se quando a curiosidade lhe atormenta. É contundente para ele perceber que mesmo imbuído das ciências mais elevadas ele não se tornou menos ignorante que os não cientistas.

A ignorância parece ser um ciclo eterno que percorre muitas existências. Mas ela não é eterna. Ela é o efeito de um singelo esquecimento que é perenizado por um esquecimento coletivo, uma força que intenta mantê-lo na ignorância e continuar desfrutando de tudo o que é mundano. O ser que nasce esquece-se que a parte está no todo e o todo está na parte. E para descobrir o significado deste preceito é preciso mais do que a interpretação literal e simbólica do aforismo. É preciso entender a mística da questão. No místico está a luz que aplacará as suas trevas.

* João Zanata Neto é escritor santa-cruzense, autor do romance “O Amante das Mulheres Suicidas”.



  • Publicado na edição impressa de 02/02/2020


SANTA CRUZ DO RIO PARDO

Previsão do tempo para: Sábado

Céu nublado
22ºC máx
10ºC min

Durante a primeira metade do dia Períodos nublados com tendência na segunda metade do dia para Céu limpo

COMPRA

R$ 5,41

VENDA

R$ 5,42

MÁXIMO

R$ 5,43

MÍNIMO

R$ 5,39

COMPRA

R$ 5,45

VENDA

R$ 5,63

MÁXIMO

R$ 5,46

MÍNIMO

R$ 5,43

COMPRA

R$ 6,38

VENDA

R$ 6,39

MÁXIMO

R$ 6,38

MÍNIMO

R$ 6,37
voltar ao topo

Voltar ao topo