CULTURA

Artigo: "Heroínas com capas remendadas"

Artigo:

Publicado em: 26 de maio de 2020 às 12:55
Atualizado em: 29 de março de 2021 às 23:02

Heroínas com capas remendadas

Nayara Moreno

Da equipe de colaboradores

A pandemia do Coronavírus fez com que o mundo (finalmente!) reconhecesse a importância do trabalho da enfermagem dentro da cadeia de atendimento na área da saúde. Diversas manifestações no Brasil e no mundo foram e ainda são feitas em homenagem à categoria: sessões de aplausos, declarações de incentivos de governos e celebridades, reportagens em diversos veículos de comunicação e até posto de gasolina dando desconto no combustível. Tudo isso é muito legal. Muito legal mesmo.

Mas a pergunta é: todo esse sentimento de gratidão da sociedade com o trabalho da enfermagem vai embora assim que a pandemia do Coronavírus for controlada? Seremos para sempre heroínas, como muitos dizem, ou voltaremos a ser “ajudantes de médicos”? Será que todos só estão sendo “bonzinhos” com a classe porque sabem o quanto precisam dela no momento e estão com medo?

O brasileiro é especialista em apontar heróis e vilões de ocasião, assim como esquecer tudo de bom ou ruim que aconteceu. É a chamada “memória seletiva”: só nos lembramos daquilo que nos interessa. Também há a “gratidão seletiva”. Ou seja, só somos gratos a determinadas classes quando o serviço da mesma é essencial. Sabe aquele porteiro de prédio que recebe mil elogios quando tira um morador preso no elevador, mas que no restante dos dias ninguém nem olha na cara dele? Então...

Sou enfermeira e hoje tenho minha própria empresa de prestação de serviço nas áreas de atendimento domiciliar, estético e prestação de serviços para empresas. Mas já trabalhei muito tempo em hospital e sei exatamente todas as dificuldades da classe profissional: rotinas exaustivas, salários baixos, condições de trabalho inadequadas (faltam materiais básicos como luva, por exemplo) e pouco reconhecimento. E isso não é só em época de pandemia não. Esse cenário é o normal para enfermeiras, técnicas de enfermagem e auxiliares de enfermagem.

Em alguns países da Europa, como a Suécia, por exemplo, os salários de médicos e enfermeiros são praticamente iguais. O prestígio também. É claro que não todos países desenvolvidos do mundo que têm essa realidade. Mas é verdade também que até entre países com grau inferior de desenvolvimento, poucos tratam a enfermagem com tamanha negligência como o Brasil.

Nos últimos dias nós comemoramos a Semana da Enfermagem. Fiquei pensando: será que, por conta de tamanha evidência pontual, estudantes do Ensino Médio vão se encantar com a profissão e teremos uma grande quantidade de jovens querendo ser enfermeiros? Acho que seria sonhar demais.

As enfermeiras não são heroínas e nem querem ser. Nós só queremos valorização profissional e plano de carreira.

Bom domingo. E continuem lavando as mãos e usando máscaras.

* Nayara Moreno

é enfermeira

pós-graduada e

Responsável

Técnica pela

AleNeto Enfermagem 



  • Publicado na edição impressa de 17/05/2020


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