CULTURA

Beto Magnani: ‘O arroz’

Beto Magnani: ‘O arroz’

Publicado em: 20 de janeiro de 2020 às 17:36
Atualizado em: 30 de março de 2021 às 02:00

HISTÓRIAS DO MAGÚ

O arroz

Beto Magnani

Da Equipe de Colaboradores

Todo o arroz escorreu lentamente pelo furo do saco que estava dentro do carrinho. Um rastro do alimento formou-se pelo mercado, revelando o percurso do senhor que escolheu o tipo “Plus”, com todos os grãos branquinhos e do mesmo tamanho. Ficou perigoso, alguém poderia escorregar. Um segurança notou e chamou dois faxineiros antes mesmo de avisar o dono do carrinho, que até então permanecia alheio ao acontecido.

— Foi esse arroz que a gente comeu no dia da palestra. É bom mesmo. — disse um dos faxineiros ao reconhecer a qualidade dos grãos.

— Qual palestra? — respondeu o outro.

— Aquela que durou o dia inteiro. Pra todo mundo do mercado. Lembra não? A da camiseta bonita que tinha uma frase.

— Unidos Somos Mais.

— O quê?

— Era essa a frase.

— Não lembro direito. Dei a camiseta pra minha tia. Ela adorou.

— Só se for mais para o patrão.

— Ontem mesmo ela disse que vai com a camiseta no rodeio da semana que vem. Ela gostou mesmo. Sabe aquela casa que as cabras subiram no telhado? Saiu até no jornal.

— A que a vizinha pensou que fossem Renas?

— Isso mesmo.

— A casa é na rua da minha tia.

— Legal. Mas o quê que isso tem a ver?

— Só lembrei, ué. Larga mão de ser chato! É que foi essa tia que adorou a camiseta. Acho que justamente por causa dessa frase do “mais” que você falou.

— Se o “mais” fosse dividido por todos os que se uniram a frase faria sentido.

— Tô falando que você tá chato.

— Mas o nosso não aumenta, é o de sempre. O “mais” é pra eles.

— Pra mim valeu pela comida boa e pela camiseta. E a mulher da palestra falou umas coisas bonitas também.

— Prefiro o pastor da minha mãe.

— Vixi! É que você não conhece o pastor da minha mulher. Prefiro dez vezes a mulher da palestra.

— Antigamente chamava Lavagem Cerebral.

— Já ouvi falar disso.

— Hoje chama Palestra Motivacional.

— Foi importante pra mim. Fiquei até emocionando. Fora a camiseta.

— Não fosse a intenção...

— Vou falar uma coisa: você é gente boa, mas é chaaaaato pra caraca!

— Tá com medo do palavrão?

— Aqui dentro eu perco o emprego, mas deixa a gente sair lá fora! Vou te xingar de tudo que você possa imaginar pra você nunca mais ser essa chatice ambulante. Sua mãe que me perdoe depois.

— Foi pra não perder o emprego que você foi à palestra?

— Ah, vai catar coquinho!!!

— Depois que eu acabar de catar o arroz.

Eu ouvi, não resisti. Acompanhei enquanto olhava as prateleiras e conferia minha pequena lista de compras. O rastro estava quase chegando ao fim quando um barulho enorme invadiu o mercado. Saímos todos para a rua, curiosos. Era a carreata promocional do rodeio da próxima semana. Com direito a helicóptero. Me senti na música do Chico Buarque. A “banda” passou e os dois faxineiros continuaram lá fora. Um xingava e outro ria. Abandonaram o rastro. Eu também. Voltei às prateleiras.

(Magú)



  • Publicado na edição impressa de 12/01/2020


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