CULTURA

Centro Social completa 35 anos de atividades

Fundada pelo saudoso frei Chico, Instituição deu origem à “Casa do Menor” e à famosa chocolataria

Centro Social completa 35 anos de atividades

Voluntárias passam os dias que antecedem a Páscoa fazendo ovos de chocolate para vender; renda é destinada à manutenção da própria instituição

Publicado em: 05 de março de 2022 às 04:06
Atualizado em: 11 de março de 2022 às 19:56

Sérgio Fleury Moraes

Uma obra social que prosperou. Este é o “Centro Social São José”, que na última quinta-feira, 3, completou 35 anos de atividades em Santa Cruz do Rio Pardo. Fundado pelo saudoso frei Francisco Pessuto, o “Frei Chico”, a instituição também deu origem à “Casa do Menor”, outra entidade assistencial de acolhimento que funciona atualmente no bairro Itaipu e terá uma nova sede ao lado da chocolataria do Centro Social, cujas obras já começaram.

O Centro Social era o sonho do frei Chico, pároco da Igreja de São José que morreu em 2004. Ele contou ao DEBATE, no mesmo ano de seu falecimento, que a presença constante de crianças nas ruas o incomodava. Eram os anos 1980 e frei Chico fez valer os caminhos que escolheu para o trabalho sacerdotal: pobreza e crianças.

Naquela época, Santa Cruz do Rio Pardo ainda tinha favelas e frei Chico se compadecia com o olhar esfomeado de crianças pobres mendigando pelas ruas. Era a hora de agir. Ele reuniu um grupo de mulheres — entre elas Mônica Brandini e, depois, Angela Sato — e começou a desenhar o que seria o futuro Centro Social São José. O terreno no bairro São José era municipal, que foi doado à Cúria Diocesana e em seguida à própria instituição.

Frei Chico: seu amor pelos pobres e pelas crianças criou o Centro Social

As mulheres, aliás, sempre foram maioria no grupo que comanda o Centro Social. É por isso que o grupo ficou conhecido como “as mulheres do frei Chico”. Além do sacerdote, dois homens presidiram a entidade — Airton Seixas, em 2020, e o atual presidente, Élcio Belei.

Segundo Ana Paula Stramandinolli, a diretoria foi ficando mista ao longo dos anos, com as tarefas divididas entre homens e mulheres.

A construção começou em 1985 e a instituição passou a funcionar oficialmente no dia 3 de março de 1987. No dia seguinte, uma Quarta-feira de Cinzas, chegou o primeiro grupo de 30 crianças. E lá se vão 35 anos. Hoje, há 178 crianças matriculadas.

No início dos anos 1990, o mesmo frei Chico idealizou a construção da “Casa do Menor Adelina Aloe”, no bairro Itaipu, em terreno doado pela família Aloe, que atende crianças e adolescentes em regime de internato. Em 1996, teve início a fabricação de ovos de páscoa, inicialmente apenas para as crianças do Centro Social e que logo se transformou numa das principais fontes de renda da instituição. Após a morte do religioso, a fábrica, já modernizada, foi batizada de “Chocolataria Frei Chico”.

E como todas estas obras foram possíveis? É que frei Chico conseguiu mobilizar a sociedade santa-cruzense e recorreu a inúmeros países do mundo em busca de doações. Ele lançou um projeto de “adoção a distância” que envolveu não apenas famílias de Santa Cruz como entidades do exterior, principalmente da Itália.

Sede do Centro Social

O programa teve a ajuda essencial da instituição italiana Cáritas, de Parma, além da ABBA de Milão. Até hoje, embora em menor valor, há ajuda externa para o Centro Social.

Em quase quatro décadas, o Centro Social se notabilizou por formar crianças e também assistir as próprias famílias, ajudando na sua estruturação. Mônica Domingos Brandini, por exemplo, atua na coordenação desde a sua fundação, há 35 anos. Na verdade, ela estava prestes a deixar Santa Cruz quando recebeu o convite de frei Chico para ajudar na fundação do Centro Social. E foi ficando.

Mônica abandonou até mesmo cargos com aprovação em concursos públicos para se dedicar integralmente à instituição. “Eu tinha o sonho de morar em Curitiba, mas o chamado de frei Chico tocou meu coração. Hoje sou funcionária, mas tenho a humildade para reconhecer que muito mais importante são os voluntários que se dedicam à instituição”, afirmou.

Aparecida Alves Pereira Diniz, 66, também trabalha na instituição desde a fundação. Fez de tudo, principalmente na cozinha, onde ainda atua. Convidada pelo próprio frei Chico, ela disse que tinha dois filhos na faculdade e se esforçou para nunca sair do Centro Social. Os filhos se formaram e Aparecida permanece na instituição.

A monitora Cristina Miotto faz atividades com crianças

“Eu comecei em 1987 e acompanhei toda a construção. Passei também pela tristeza da morte do frei Chico, que certamente está cuidando desta obra de onde estiver”, disse.

Todas as funcionárias e voluntárias são chamadas de “tias”. E é muito comum o reencontro delas com ex-alunos, quase sempre emocionante. Mas todos, “tias” e alunos, têm histórias para contar. Eliana Cristina Miotto, 43, por exemplo, está no Centro Social há 27 anos. Ela recebeu o convite de frei Chico quando ainda era adolescente e, além de trabalhar como doméstica, vendia produtos do Paraguai de casa em casa.

“Um dia, encontrei o frei na rua e ofereci uns sabonetes. Ele não comprou, mas me pediu para procurá-lo no dia seguinte na Casa Paroquial, quando me ofereceu um emprego. Continuei, então, saindo de porta em porta, mas para oferecer carnês de doações para o Centro Social”, conta Cristina.

Hoje monitora social da instituição, trabalha com pré-adolescentes e se sente realizada. “Tenho uma enorme gratidão por este trabalho. De vez em quando eu encontro ex-alunos do Centro Social, seja nas ruas ou nas redes sociais. É emocionante a gente saber que uma criança, que poderia andar por caminhos tortos, hoje tem uma família e é uma pessoa de bem”, disse.

FAMÍLIA — Na tarde de quinta-feira, 3, crianças e “tias”, entre elas Vina e Mônica Brandini, se reúnem na frente do pomar da instituição

Algumas mulheres ganharam até apelidos pelo longo tempo de trabalho. Aldevina Nogueira Gabriel, 57, virou a “Vina do frei Chico” após 30 anos de atividades. Ela morava com a cunhada em São Paulo quando veio para Santa Cruz e foi convidada para fazer uma entrevista com a saudosa diretora Ângela Sato, que era o “braço direito” de frei Chico.

Lavou fraudas e todo tipo de roupa até que o próprio frei Chico a transferiu para ajudar na montagem da chocolataria. “Foi ele quem me fez voltar a estudar. Afinal, perdi meus pais muito cedo e precisei deixar a escola. Voltei a ter oportunidade após entrar no Centro Social”, disse. “O frei foi o amigo e conselheiro de todos nós”.

Rosilda Moura, 55, trabalha na entidade há 20 anos, desde a época em que a “Casa do Menor” funcionava junto com o Centro Social. Começou na cozinha, foi para a lavanderia e ainda hoje faz “de tudo um pouco”. Ela conta que, de vez em quando, entra uma funcionária nova e a cumprimenta como “tia”, indicando que se trata de ex-aluno. “A gente nem se lembra, pois em duas décadas conheci milhares de crianças. Mas vale a pena”, afirmou.

A funcionária não tem filhos, mas considera que atualmente tem “178 filhos”, que é o total de alunos do Centro Social.

A cozinheira Rosilda

Entre as voluntárias, há mulheres de todas as idades. Mirtes Saliba, por exemplo, tem 85 anos e se dedica à chocolataria há pelo menos 15 anos. “Eu embalo os ovos e bombons. É uma satisfação enorme ajudar as pessoas e meu salário está garantido lá no céu”, brincou. Mirtes só se afastou por uns dias durante a fase crítica da pandemia, mas voltou logo e continua trabalhando. Perto da Páscoa, fica de segunda a sexta-feira.

Carmen Lucas, 72, é voluntária há 20 anos e também vendia tapetes para o Centro Social. “Eu já perdi meu marido e moro sozinha, pois meus filhos já formaram famílias. Então, o meu trabalho na instituição é minha fonte de vida”, afirmou. 

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