CULTURA

Fundador chegou a Santa Cruz do Rio Pardo já viúvo e morreu em Tupá

Fundador chegou a Santa Cruz do Rio Pardo já viúvo e morreu em Tupá

Publicado em: 13 de dezembro de 2020 às 18:43
Atualizado em: 30 de março de 2021 às 11:20

O pioneiro Manoel Francisco Soares foi comprovadamente o primeiro habitante de Santa Cruz do Rio Pardo depois do período das sesmarias

Sérgio Fleury Moraes

Da Reportagem Local

O sertanejo Manoel Francisco Soares é reconhecido por historiadores como o fundador de Santa Cruz do Rio Pardo, junto com o padre João Domingos Figueira. Ele era “bugreiro” e responsável pelo início do extermínio dos índios Coroados — ou “Caingangues” — que habitavam as terras da região. Os historiadores Celso Prado e Junko Sato Prado praticamente “fecharam” a história de Soares, descobrindo que homem nascido em Taubaté já era viúvo quando chegou ao sertão e seus restos mortais estão no antigo cemitério de São Domingos do Tupá, a comarca eclesiástica que ficava na região de Domélia e desapareceu no século passado.

Manoel fazia parte da tropa de José Theodoro de Souza, um dos últimos bandeirantes a desbravar o sertão de São Paulo. A comitiva avançou pela região nos idos de 1850. Theodoro ia abrindo frentes, matando índios e indicando terras para seus seguidores. Soares ganhou a gleba do rio Alambari até o rio Pardo. Abriu, então, uma fazenda no bairro Jacutinga.

Era sua parte na participação do bando de Theodoro, depois ampliada. Desde então, nenhum “branco” havia pisado nas terras que dariam origem a Santa Cruz desde a época das sesmarias, quando o Império loteava as províncias (atuais estados) e entregava as áreas para a um beneficiário em nome do rei de Portugal.

Batismo de João Domingos Figueira, nascido em 1810 na Freguesia de Nossa Senhora das Graças, em Portugal



De acordo com Celso Prado, o pioneiro não conseguia se aproximar da atual área urbana de Santa Cruz porque era impedido pelos índios. Ele se estabeleceu com mais de 20 pessoas, a maioria filhos e parentes, e começou a “limpar” as terras. Isto significava matar índios, pois os “brancos” tinham armas.

O jornal “Correio do Sertão”, que circulou em Santa Cruz do Rio Pardo entre 1902 e 1904, publicou vários textos afirmando que Manoel Francisco Soares foi o primeiro habitante do que seria um povoado a partir de 1962. Foi neste ano que o padre João Domingos Figueira, que também se tornou fazendeiro, pediu a Soares a doação de uma gleba para a formação do lugarejo.

Cruz no piso da antiga Igreja Matriz indicava o local do sepultamento do padre Figueira



Soares doou 100 alqueires. Pouco tempo depois, a filha doaria mais terras. O povoado foi se formando e em 1857 existe a primeira referência eclesial citando o bairro de Santa Cruz do Rio Pardo. Foi um batizado de uma criança, feito pelo padre Andrea Barra. Santa Cruz, então, pertencia à freguesia de São Domingos do Tupá, município de Botucatu.

O padre João Domingos Figueira teria chegado à região provavelmente em 1861.

Foi ele quem construiu a primeira igreja do local e as primeiras edificações, ainda de “pau a pique”.

Manoel Soares fez a doação das terras avocando um santo da Igreja católica, o que era comum na época. Isto criou um problema anos mais tarde, pois nenhum terreno estava legalmente registrado. O próprio padre Figueira, em carta dirigida ao bispo em 1862, aborda as condições da igreja de Santa Cruz do Rio Pardo sem citar o doador das terras.

Foi, então, que a Igreja participou de uma ação judicial em 1891 para corrigir a falha. Os documentos atestaram que as glebas foram doadas por Soares, fato confirmado por várias testemunhas em juízo.

Celso e Junko Prado descobriram que Manoel Francisco Soares era viúvo quando chegou à região. “Ele entrou neste sertão quando tinha 57 anos. Encontramos um documento de São João da Boa Vista, datado de 1843, do casamento da filha Rita, onde consta que a mãe era Ignácia Porcina de Sene, já falecida”, contou Celso Prado.

Reforma da Igreja Matriz no início do século passado; templo foi construído pelo padre Figueira em seu primeiro estágio



Segundo o historiador, Soares morreu em São Domingos do Tupá, para onde se mudou, e está enterrado no antigo cemitério, o único local que sobrou da antiga comarca eclesiástica. Tupá teve comércio forte até que começou a decair com a crise do café de 1929. A população foi abandonando a cidade e todos os prédios foram derrubados. Restou apenas o cemitério, hoje um local rodeado por árvores no meio de um pasto.

Soares morreu esquecido, cercado apenas pela família. Segundo Celso Prado, há indícios de que teria Alzheimer, uma vez que relatos contam que o ancião estaria “louco” no final da vida. “Segundo consta, ele nem se lembrava quem era”, contou. A morte do pioneiro teria ocorrido na fazenda de Messias de Andrade, irmão de Joaquim Manoel de Andrade, o político que transformou o lugarejo de Santa Cruz do Rio Pardo em município.

Padre Figueira ficou em Santa Cruz e se tornou vigário anos depois. Nascido em Portugal, foi fazendeiro, dono de escravos e teve filhos. Era, enfim, um religioso fruto daquela época do sertão. Morreu em 1878 e foi enterrado no piso da Matriz de São Sebastião, cuja construção teve origem na velha igreja edificada com madeira por João Domingos Figueira.




Quadro de Acácio Gonçalves, na escola "Sinharinha Camarinha" (Foto: Junko Sato Prado)



Quadro de Acácio retrata

o pioneiro padre Figueira


No saguão de entrada da escola “Sinharinha Camarinha” está pendurado um quadro pintado pelo consagrado artista santa-cruzense Acácio Gonçalves, que morreu em 1965. A imagem é de um padre catequizando índios numa tribo à beira de um rio. Durante muitos anos, imaginou-se que a tela representava o padre jesuíta José de Anchieta, fundador da cidade de São Paulo e célebre catequizador de índios no século XVI. Na verdade, o quadro de Acácio Gonçalves retrata o padre Figueira, um dos fundadores de Santa Cruz do Rio Pardo junto com o fazendeiro Manoel Francisco Soares. A cena, portanto, mostra possivelmente a primeira capelinha do lugarejo, construído pelo padre Figueira no bairro conhecido como “Chafariz”. Foi naquela parte da cidade, onde estão os casarões mais antigos, que surgiu Santa Cruz do Rio Pardo, perto do local em que o ribeirão São Domingos desemboca no rio Pardo.



  • Publicado na edição impressa de 6 de dezembro de 2020


SANTA CRUZ DO RIO PARDO

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