CULTURA

João Zanata Neto: 'Climatério da Gaia'

João Zanata Neto: 'Climatério da Gaia'

Publicado em: 10 de novembro de 2019 às 23:12
Atualizado em: 17 de março de 2021 às 18:42

Climatério da Gaia

João Zanata Neto

Da Equipe de Colaboradores

Ouço trovões agora. O calor está insuportável mesmo agora onde a escuridão da noite denota as primeiras estrelas cintilantes. Espero que chova muito. Este calor provoca-me um desconforto, uma certa indolência latina, um tipo de preguiça dos trópicos. É agora que os pecados da gula cobram as suas punições. Somo tolos imigrantes e saudosos da culinária europeia, aquela caloria injustificada que ingerimos em nome da saudade. Mas, enfim, a chuva começou e a fúria dos trópicos varre a fina terra roxa que nos tem enterrados em vida.

É uma tempestade furtiva que açoita as árvores não lhes dando muito o que beber. Ela vem para testar os velhos telhados com os seus ventos fortes. É a força que destrói para renovar como sempre dizem. Mas, como eu previ, ela foi rápida e insuficiente, retumbando trovoadas sem ao menos regar os campos. De bom ela só devolveu os ares mais frescos e úmidos. Este nosso solo tórrido e ressequido ainda padece por água que não chove.

Aqui nos trópicos, nos acostumamos com as chuvas fartas. Quiçá fossemos aguerridos como o povo do deserto e as suas irrigações, as suas plantações de regadio e a sua temperança ante o infortúnio costumeiro. Mas mesmo lá nas terras desérticas, o sal abundante teve o capricho de destruir as civilizações mais prósperas. A natureza traz o imprevisto e aniquila aqueles que não se adaptam. As riquezas que produzimos são mal destinadas. Ignoramos o elo frágil que sustenta uma civilização. O mundo ainda há de sofrer muito com esta negligência.

Por mais que se tem tentado, é difícil estimar o quanto as civilizações têm contribuído para o desarranjo climático. Esta dúvida é o que faz nos manter inertes, consumindo e poluindo sem preocupações com as consequências. Enquanto a situação não se exaspera, nenhuma providência é tomada.

Contudo, somos gente moderna acostumada às benesses do consumo. Nem todos os números nos impressionam. É inútil convencer uma geração tecnológica dos efeitos colaterais da modernidade. As circunstancias que motivam uma civilização mundial impelem a todos uma condição que nem sequer pensa em uma nova forma de economia não predatória dos recursos naturais. Ao contrário, ela sonha com novos mundos, outros planetas habitáveis semelhantes ao nosso.

Pequenas mudanças, no entanto, estão surgindo gradualmente, mas são lentas e isoladas nas mentes de poucas pessoas esclarecidas e preocupadas. Olhar para as grandes civilizações mundiais e visualizar uma futura extinção é uma ideia absurda. As civilizações têm uma duração muito longa e é quase impossível imaginar o perecimento de algo tão assentado. No entanto, a história do mundo tem grandes exemplos que provam esta possibilidade. Enquanto o futuro ainda não se apresenta, continuamos descrentes, sempre acreditando que haverá alternativas para fugir do infortúnio.

Antes as grandes catástrofes eram atribuídas à ira dos deuses. Hoje o racionalismo moderno com as suas pesquisas avançadas fala em ciclos cataclísmicos naturais decorrentes da espontânea instabilidade climática do planeta. A intervenção humana como o fator de desarranjo climático ainda é considerada desprezível e incapaz de profundas transformações. Conviveremos com opiniões contrárias até que se verifiquem uma condição climática de real expoente quando, talvez, não haverá tempo e recursos para uma reversão. Enquanto os rigores climáticos não afrontarem a sustentabilidade da civilização, continuaremos desfrutando dos últimos alentos da natureza como se nada de pior pudesse acontecer. 

* João Zanata Neto é escritor santa-cruzense, autor do romance “O Amante das Mulheres Suicidas”.



  • Publicado na edição impressa de 03/11/2019


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