CULTURA

Lolão, o pequeno grande homem

Lolão, o pequeno grande homem

Publicado em: 01 de dezembro de 2019 às 15:20
Atualizado em: 30 de março de 2021 às 11:00

Ele trabalhava como fiscal da

prefeitura, era anão e ‘bravo’, mas tinha

um coração grande como poucos


Sérgio Fleury Moraes

Da Reportagem Local

Pelo nome — Fioravante Manzo Filho —, ninguém o conhecia. Mas por todos os cantos da cidade, era “Lolão”, um anão que se aposentou como fiscal na prefeitura de Santa Cruz e morreu aos 60 anos, em setembro de 2000, após complicações da diabetes. Foi uma figura extremamente popular e tinha um gênio muito forte. “Na verdade, quem conheceu meu tio sabe que ele, mesmo bravo, tinha um coração grande como poucos”, conta a sobrinha Ana Maria Manzo, hoje aposentada como diretora da escola “Sinharinha Camarinha”.

INQUIETO — Padre brinca com Lolão numa lambreta



Lolão nasceu vítima de nanismo, uma mutação genética que afeta o crescimento dos ossos. Quem é acometido de nanismo, possui uma estatura média de 1,20 metro, além de arqueamento das pernas e problemas nas articulações dos braços. No Brasil, os casos são raros, com cerca de 150 mil pessoas por ano, mas já existe até uma associação para defender os direitos dos anões, que geralmente são discriminados.

Lolão com Laudo Natel



Claro que Fioravante também foi muito discriminado. Ele sofreu durante toda a vida o que hoje é chamado de “bullying”, pois era até alvo de piadas. Quando isto acontecia, Lolão saía do sério. No entanto, a maioria das pessoas o respeitava.

“Meu tio era sui generis”, conta a sobrinha Ana Maria Manzo, 64, lembrando que, ao mesmo tempo em que era conhecido como bravo, Lolão adorava crianças e tinha muitos amigos. Era, inclusive, convidado para todos os eventos. “Mas quando alguém fazia alguma brincadeira, ele mandava todos os palavrões conhecidos”, diz, rindo.

ÚNICO MEDO — Sobrinha, Ana conta que Lolão tinha pavor de chuva



Nas ruas, numa bicicleta



O curioso é que Fioravante conseguiu um emprego na prefeitura, numa época em que não existia o concurso público, e foi escalado para ser fiscal. Assim, apesar das dificuldades físicas, andava o dia todo fiscalizando comércio, construções ou vendedores ambulantes. “Invariavelmente ele pedia carona. Todo mundo sabia dos problemas dele e sempre o levavam para todos os cantos da cidade”, conta Manzo.

No serviço, fazia valer sua autoridade como fiscal. Se alguém achava ruim ou fazia pouco caso de um anão, Fioravante chamava a polícia e registrava um boletim por desacato. Sempre levou o trabalho a sério.

Dos seis irmãos, Lolão foi o único a nascer com um problema de mutação genética. O pai o levou a clínicas e médicos em São Paulo, mas não havia o que fazer. Como não se casou, passou a viver com os pais. Com a morte deles, herdou uma casa onde morou até o fim da vida.

Aliás, Lolão adaptou sua moradia de acordo com suas condições físicas. Tudo era pequeno, desde os bancos até mesas e sofás. As pias, janelas e torneiras eram mais baixas do que o normal. “Parecia uma casa de criança”, brinca a sobrinha Ana.

Em 1963, toda a família sofreu com o desastre dos torcedores da Santacruzense, que matou dez moradores da cidade, entre eles um dos irmãos, Adalberto Manzo.

AMOR — Lolão e a noiva Miguelina: casamento não se consumou



Noivado desfeito

Lolão frequentou os bancos escolares, mas Ana Manzo não soube dizer até que série ele alcançou. Na verdade, sofria também com ‘bullying’ na escola, mas saiu dela sabendo ler fluentemente e era muito bom em cálculos. “Era especialista em matemática, principalmente para contar o dinheiro dele”, brinca Ana Manzo.

Claro que Lolão também se apaixonou, tanto que foi noivo de uma anã que morava em Santa Cruz do Rio Pardo. “O nome dela era Miguelina. O noivado foi uma grande festa, mas o Lolão se atrasou muito. Na verdade, os amigos, entre eles Ubirajara Gonçalves, o levaram para beber e, quando deram conta, ele estava no hospital. Quando meu pai foi buscá-lo, estava brigando com todo mundo na Santa Casa. Depois, ele ainda participou da cerimônia quase dormindo”, conta Ana, aos risos. O noivo nem percebeu que estava com a botina trocada. “Foi um grande vexame, mas ele ficou noivo”, lembrou.

Durante brincadeira com amigos da prefeitura



O casamento, entretanto, não vingou. Ana conta que houve comentários sobre uma possível traição de Lolão — ou vice-versa. E o casal terminou o relacionamento. “Também houve boatos em torno de outro amor dele, uma telefonista que trabalhava no posto de Sodrélia. Ela era anã”, contou.

Religioso, Lolão foi coroinha da Igreja Católica e seguia os padres em todo lugar. “Na época tinha padre que ia até em comícios. Aí o Lolão ia junto”, conta. Por conta disso, conheceu muitos políticos e autoridades, como o ex-governador Laudo Natel.

Era vaidoso e andava sempre bem arrumado e perfumado. No entanto, tinha outras duas paixões — crianças, que ele adorava, e comer. “Ele comia muito e a gente sempre alertava sobre os riscos. Comia de tudo, era a alegria dele fazer um prato enorme”, conta a sobrinha. “Se deixasse, ele bebia junto uma garrafa grande de coca-cola”, lembra Ana.

Por conta disso, Lolão ganhou peso e passou a ter problemas de saúde. O peso, por sinal, passou a ser incompatível com seu tamanho. Ao adoecer, Lolão ficou sob os cuidados da irmã Vera. Em setembro de 2000, a cidade se despediu do anão mais conhecido de sua história.

Após sua morte, Ana Manzo descobriu uma coleção curiosa do tio: “santinhos” de gente que morreu, todos numa pequena caixa impecavelmente conservados. 



* Colaborou Toko Degaspari



  • Publicado na edição impressa de 24/11/2019


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