CULTURA

‘Taturana’, a cachaça rara da Verdinha

‘Taturana’, a cachaça rara da Verdinha

Publicado em: 12 de abril de 2020 às 19:06
Atualizado em: 29 de março de 2021 às 21:16

Não há muitas informações sobre

marcas antigas da “Verdinha”; vila

próxima era conhecida como “Taturana”


A Verdinha e sua "irmã", a Taturana



Sérgio Fleury Moraes

Da Reportagem Local

Cobiçada por colecionadores, especialmente da região de Santa Cruz do Rio Pardo, as garrafas da antiga cachaça Verdinha já são consideradas raras. A lendária pinga começou a ser fabricada nos anos 1920, num alambique no bairro rural da Água das Pedras, numa sociedade entre os irmãos Pegorer. Décadas depois, a família vendeu o alambique e a indústria se instalou na área urbana, na vila Maristela.

O que poucos sabem é que a Verdinha também fabricava aguardentes com outros dois nomes. O produto era o mesmo, mas as embalagens mudavam de nome para agradar consumidores de outros locais, especialmente do estado do Paraná.

É o caso da “Gralha Azul”, que foi fabricada exclusivamente para o Norte do Paraná. A gralha azul é considerada a ave-símbolo daquele Estado, onde há grande quantidade do pássaro. Nem precisa dizer que a aguardente chegou a ser uma das mais vendidas naquela região.

Outra cachaça da Verdinha foi a “Taturana”, cuja fabricação remonta aos tempos do alambique na Água das Pedras. Quando a fábrica mudou de dono — e de local, já que foi instalada num barracão entre as vilas Madre Carmem e a Maristela —, a “Taturana” continuou a ser engarrafada.

Há quem acredite, aliás, que a vila Divineia ganhou o primeiro nome de “Taturana” pela proximidade com a indústria de cachaça.

Garrafa da Taturana, fabricada pela Verdinha de Santa Cruz do Rio Pardo



Em Santa Cruz do Rio Pardo, o único colecionador que possui exemplares da “Taturana” é o advogado Daniel Alexandre Coelho, cujo acervo possui mais de 400 garrafas de diversas marcas.

A fabricação de cachaças teve um “boom” na região entre as décadas de 1920 e 1940. Além da Verdinha, que ficava nas proximidades da Usina São Luiz, o próprio patriarca da usina, Orlando Quagliato, chegou a ser dono de um alambique que fabricava a caninha “Leão”.

No início dos anos 1950, Orlando resolveu montar uma usina de álcool. Fechou o alambique e começou a construir os equipamentos que dariam origem à empresa que hoje é uma potência econômica em todo o Estado. Segundo consta, o pioneiro do grupo Quagliato adquiriu suas primeiras máquinas — usados — de usinas desativadas de Piracicaba e até do Nordeste.

Já a “Verdinha” de Santa Cruz teve ainda outros donos até fechar as portas em meados da década de 1970. Seu último dono foi o empresário Rubens Carmagnani. No entanto, ficaram as lembranças e a fama das aguardentes Verdinha, Gralha Azul e Taturana.

Adega de Antônio Lino possui móveis finos, barril de carvalho e centenas de garrafas, muitas delas raras



Advogado de S. Cruz amplia coleção

e possui exemplar da ‘Gralha Azul’

(Fotos: André Fleury)



Quando o jornal fez uma reportagem sobre a coleção de cachaças do advogado Antônio Lino Sartori, 70, em 2015, ele ainda cobiçava um exemplar da “Verdinha”. Hoje, construiu uma casa mais ampla — e, de quebra, aumentou a coleção. Além de várias garrafas da Verdinha, possui uma rara “Gralha Azul”, que também era fabricada pelo mesmo grupo na fazenda Água das Pedras. “Graças àquela reportagem, ganhei minhas primeiras Verdinhas”, contou, agradecido.

Na época, ele ganhou até uma coleção de um dos fundadores da “Velho Barreiro”, que também leu a reportagem e decidiu doar suas garrafas ao advogado. “Ele disse que possivelmente elas iriam acabar. Tirou informações sobre mim e, enfim, fez a oferta”, contou. “Não vacilei”.

Sartori é apaixonado por cachaças, embora não seja um bebedor contumaz. “Na verdade, nem aguento. Bebo só socialmente, mas gosto de colecionar”, contou o advogado.

RARIDADES — Coleção de Sartori tem a Verdinha e a “irmã” Gralha Azul



Ele e o irmão já foram sócios de um alambique em Sodrélia, que vendia o produto em garrafas e garrafões sem rótulo. Ele ainda tem algumas unidades — guardou um garrafão por ano — e criou um rótulo especial: “Cachaça do Doutor”. Em primeiro plano, está a foto da residência do sítio da família, no distrito de Sodrélia.

Funcionário da usina São Luiz há mais de 20 anos, Sartori começou a viajar, entrar em contato com novas marcas, fez muitas amizades e começou a ganhar garrafas antigas. Pronto, estava começando uma grande coleção.

Numa das viagens, foi parar na região de Salinas, conhecida como “berço das cachaças”. Mas foi na Régis Bitencourt que ele se impressionou com uma coleção que ficava à vista do público, num móvel pendurado. “Eu notei uma garrafa da Verdinha e fiquei curioso. Tentei tirar foto, mas o dono não permitiu”, contou. Quando quis saber a história da coleção, Sartori ficou surpresa ao saber que ela havia sido adquirida do comediante Chico Anysio, que morreu em 2012. “Contaram que, quando ele se casou com a Zélia [Cardoso de Mello, ex-ministra da Fazenda no governo Collor], ela exigiu que ele parasse de beber e vendesse a coleção”.

"Cachaça Adega do Doutor": aguardente foi fabricado no antigo alambique de Sartori em Sodrélia



Adega com requinte

Os filhos e a mulher, Mazé, até que gostam da coleção. “Mas de vez em quando eles dizem que estou começando a exagerar”, diz, rindo.

E não é menos. Antonio Lino Sartori construiu uma nova residência, na mesma rua Joaquim Manoel de Andrade, onde mora há pouco menos de dois anos. Mas a planta do imóvel começou a ser elaborada a partir de uma adega especial para a coleção. E ficou realmente um espetáculo.

Na porta, uma placa batizou o espaço: “Sartori Cachaçaria”. Na entrada, incrustado num móvel de madeira, há um antigo barril — também chamado de “cartola”, presente de Luizito Quagliato — com a pinga que fabricava em Sodrélia. Nas paredes, novas estantes exibem centenas de garrafas de cachaça de todos os tipos e lugares. Logo, o local vai necessitar de um “puxadinho” para permitir o aumento da coleção.

Alguns exemplares da coleção são oferecidos no mercado por mais de R$ 1 mil. É o caso da “Maria da Cruz”, que foi fabricada pelo ex-vice-presidente de Lula, José de Alencar, num alambique de Minas Gerais que fechou as portas após a morte do patriarca em 2012. 

* Colaborou Toko Degaspari



  • Publicado na edição impressa de 05/04/2020


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