CULTURA

Tonico Lista: o jovem que virou coronel

Como entender o personagem mais emblemático da história de Santa Cruz

Publicado em: 09 de outubro de 2021 às 04:25
Atualizado em: 09 de outubro de 2021 às 05:55

Sérgio Fleury Moraes

Imagine uma rua em que caminham homens armados e em certo momento há tiroteio. Certamente você deve estar pensando num filme de faroeste, daqueles que costumam passar no cinema. Mas este cenário pode ter sido o de Santa Cruz do Rio Pardo no final do século 19 e início do século 20. Claro que as pessoas não andavam com as armas expostas na cintura, mas escondidas no paletó.

Era assim mesmo a época em que o cano da garrucha falava mais alto. E o personagem mais famoso deste período foi o coronel Antônio Evangelista da Silva, conhecido como “Tonico Lista”. Ficou marcado na história como violento e sanguinário, aquele que matava ou mandava assassinar seus adversários.

Mas não foi bem assim, pois Tonico, na verdade, foi fruto de uma época, assim como os tempos do faroeste nos Estados Unidos. Tanto que ele foi assassinado por seus inimigos, que não conseguiam derrotá-lo nas eleições ou mesmo em processos judiciais.

Ainda jovem, Antônio Evangelista da Silva foi companheiro e apoiador do coronel João Batista Botelho, considerado o primeiro “prefeito” – na época o cargo era de intendente – de Santa Cruz do Rio Pardo. No dia 8 de julho de 1902, sem qualquer explicação, o coronel Botelho morreu depois de passar dias agonizando após dar um tiro no próprio ouvido.

Ninguém entendeu aquele ato de desespero, uma vez que Botelho era um rico fazendeiro e político influente. Mas ele havia perdido as eleições para o grupo de Francisco de Paula Abreu Sodré, o que pode ter aumentado uma suposta depressão. Tonico Lista, então, assume o controle do grupo e, em poucos anos, vence Sodré e se torna o chefe político de Santa Cruz do Rio Pardo. Ficou mais de dez anos no poder.

Para se ter uma ideia da importância de Santa Cruz naquela época, dois filhos de Francisco Sodré se transformaram em importantes personalidades políticas do País. Um deles foi o deputado constitucionalista Antônio Carlos de Abreu Sodré. Outro, Roberto Costa de Abreu Sodré, foi deputado, governador de São Paulo e ministro das Relações Exteriores do Brasil.

O curioso é que Tonico não herdou apenas o poder político de Santa Cruz, mas também a viúva. Dois anos depois, ele se casou com Guilhermina Brandina da Conceição, uma bela mulher que enviuvou com a morte de João Batista Botelho. Não há nenhuma notícia de que Tonico e Guilhermina tiveram algum envolvimento antes do suicídio do coronel. Ao contrário, Evangelista era muito ligado a Botelho e sempre o respeitou.

Tonico virou coronel — que não é propriamente a patente militar como conhecemos atualmente  e, dono da fazenda Mandaguahy em Sodrélia, ficou milionário e estendeu seu poder por toda a região. Naquele início do século passado, a cidade possuía uma imensidão de terras e os atuais municípios de Bernardino de Campos, Chavantes, Ourinhos ou Ipaussu eram vilas controladas por Santa Cruz do Rio Pardo.

A viúva de Tonico

Mas, como todo político poderoso, Tonico Lista ganhou inimigos. E igualmente poderosos, a ponto de se ligarem a um ex-juiz de Santa Cruz que havia sido expulso da cidade pelo coronel e prometeu se vingar. O fato aconteceu no início do período de Tonico como chefe político. Ele e o então juiz Cardoso Ribeiro chegaram a discutir na residência do coronel e Tonico deu 24 horas para o magistrado deixar a cidade.

Cardoso fugiu escondido numa carroça de pão do padeiro João Dalmati até Bernardino de Campos, pois quis evitar embarcar para a capital a partir da estação de Santa Cruz. Porém, humilhado, ele jurou se vingar. Nos anos seguintes, Cardoso fez carreira no Judiciário e se tornou secretário de Segurança Pública e Justiça de São Paulo. No final de sua trajetória, foi ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Pois bem. Os adversários políticos do coronel não conseguiam vencê-lo nas urnas e, então, recorreram ao ex-juiz, que agora era o secretário de Estado. Sob comando de Cardoso Ribeiro, vieram para Santa Cruz um novo juiz e um promotor de sua absoluta confiança. Como delegado, foi designado Coriolano Goes, que mais tarde seria o chefe da guarda do presidente Getúlio Vargas.

Assim, a Justiça de Santa Cruz do Rio Pardo finalmente condenou Tonico em 1921, como mandante de dois crimes e ele foi preso preventivamente. A oposição comemorou e estampou a novidade na capa do jornal de oposição – “O Trabuco”. Mas o coronel teve a atuação de advogados brilhantes, entre eles o santa-cruzense Pedro Camarinha. Além dele, foram responsáveis pelo recurso do coronel ao Tribunal de Justiça os advogados Júlio Prestes, Altino Arantes e Raphael Corrêa de Sampaio.

Júlio Prestes, advogado de Lista que se tornaria presidente do Brasil

Muito provavelmente qualquer pessoa já deve ter visto estes nomes em ruas e monumentos espalhados pelo País. É que o ex-governador Júlio Prestes, por exemplo, que chegou a visitar Santa Cruz várias vezes para conversar com Tonico Lista, foi o último presidente do Brasil eleito pelo voto direto na chamada “República Velha”, embora não tenha tomado posse porque houve um golpe em 1930. Prestes também foi o primeiro brasileiro a ser capa da consagrada revista “Time”, dos Estados Unidos.

E todos estes advogados conseguiram livrar Tonico Lista da cadeia no final de 1921. Ele voltou a ser o chefe supremo de Santa Cruz, enquanto os inimigos voltaram a planejar um meio de afastar o coronel do poder. Certamente a morte seria a única solução, pensaram.

No dia 8 de julho de 1922, Tonico Lista tomava café e lia o jornal na venda de Mizael de Souza, na mesma quadra do antigo prédio da Câmara Municipal de Santa Cruz. De repente, um soldado da Guarda Nacional entra no recinto e, após beber uma pinga, mostra seu plano diabólico: ele saca a arma e atira contra o coronel, que ainda consegue revidar quando o assassino corre em disparada pelas ruas.

Gravemente ferido, Tonico foi levado de trem para São Paulo, em busca de uma medicina mais avançada. No entanto, morreu no vagão nas imediações de Mairinque, perto da capital.

Estava encerrado o período de poder do lendário coronel de Santa Cruz do Rio Pardo. E, surpreendentemente, sua mulher Guilhermina ficava viúva pela segunda vez, exatos 20 anos depois da morte de seu primeiro marido.

As pesquisas mais importantes sobre a vida do coronel Tonico Lista foram feitas pelos historiadores Celso Prado e Junko Sato Prado, que descobriram particularidades da vida do casal que ninguém conhecia. Mas o pioneiro pesquisador foi o saudoso professor José Ricardo Rios, autor do livro “Tonico Lista – O Perfil de uma Época”, lançado em 2004 pelo DEBATE.

Antônio Evangelista da Silva deixou obras importantes em Santa Cruz em seus anos de prefeito, como a construção do antigo prédio da Câmara, da atual biblioteca municipal e do “Grupo Escolar”, que foi sede da antiga Delegacia de Ensino do município.

Em seu livro sobre o coronel, José Ricardo Rios termina com uma avaliação correta sobre Tonico: “Atacá-lo com ou sem provas concretas era tarefa cotidiana dos que se opunham à sua liderança. Defendê-lo competia aos seus legais seguidores. Julgá-lo, agora é tarefa de Deus”.

SANTA CRUZ DO RIO PARDO

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