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Mário Nelli foi referência na música

Autor do hino oficial do município, Mário Nelli criou vários grupos musicais e foi um dos ídolos de Santa Cruz

Mário Nelli foi referência na música

Uma das formações do antigo grupo “Mário Nelli e o Conjunto do Clube dos Vinte”

Publicado em: 02 de janeiro de 2023 às 14:47
Atualizado em: 02 de janeiro de 2023 às 16:02

Sérgio Fleury Moraes

 

O músico Mário Nelli, que morreu na terça-feira, 27, vítima de complicações da covid, foi o mais brilhante da história de Santa Cruz do Rio Pardo. Era o galã dos “anos dourados”, nas décadas de 1950 e 1060, a ponto de virar até uma paródia musical cantada em bailes: “Não me toque, não me rele / Eu sou fã do Mário Nelli”.

Sua importância foi tão forte que no livro “Santa Cruz do Rio Pardo - Memórias”, o professor José Magalli Junqueira se refere a esta efervescência musical como “a era Mário Nelli”.

Mário foi um artista completo. Ao longo dos anos, foi aprendendo todo tipo de instrumento musical.

Nascido na cidade em 18 de fevereiro de 1940, Mário Nelli despertou precocemente para a música ao ouvir Dick Farney — de quem se tornou admirador — tocar piano. Farney foi considerado um dos precursores da Bossa Nova e seus acordes no piano tocaram o garoto Mário Nelli. Tinha apenas cinco anos.

 

O conjunto “Emi Eni Sete” se apresenta no saguão do Colégio Companhia de Maria, nos anos 1960

 

Nos 45 anos do DEBATE, Mário Nelli concedeu inúmeras entrevistas, contando sua trajetória e seu amor por Santa Cruz do Rio Pardo. Claro que a cidade já deu dissabores ao músico, mas isto acontece em qualquer caso de amor.

“O Dick Farney tinha um estilo único e me impressionou. Fui envolvido com aquela música e logo comecei a aprender piano com minha tia Olívia”, contou ao jornal.

Criança, ele dizia que não queria aprender naquele piano, mas no de Dick Farney. Mas logo já estava “tirando a música de ouvido”.

 

"Mário Nelli e o Conjunto do Clube dos Vinte”, se apresentava não apenas em Santa Cruz, mas em inúmeras cidades do interior paulista

 

Aos 16 anos, era apaixonado por rádio, principalmente a Nacional, que era uma espécie de “Rede Globo” nos anos 1950. Foi aí que Mário passou a prestar mais atenção no som do acordeão, que já ouvia nas festas rurais dançantes da Grumixama, onde morava o avô.

A música instrumental é assim mesmo. Ela tem o momento certo de despertar o sentimento nas pessoas. Foi o caso de Mário com o acordeão.

O adolescente não perdeu tempo e aproveitou a chegada ao município do professor Giovanni Lanfranchi, que deu aulas de acordeão no “Conservatório Musical Osvaldo Lacerda” durante décadas.

 

Mário Nelli tocava piano, acordeão, violão e flauta: era um músico completo

 

Mário Nelli sempre foi grato aos professores. “A semente da minha harmonia musical veio com o professor Giovanni. Com suas dicas incríveis, aprendi muita coisa na música”, contou Nelli, que acrescentou o acordeão em seus instrumentos.

Aos 18 anos, ganhou um violão de presente de um primo. Aprendeu dedilhando sozinho. Foi a época em que Mário se entregou totalmente à música, contando, claro, com um pouco de sorte.

É que Santa Cruz passou a ter dois clubes fomentando a música na cidade. O novo prédio do Clube dos Vinte — hoje sede da Associação Comercial e Empresarial — foi entregue em 1958, enquanto no ano seguinte o Icaiçara Clube abria seus salões aos sócios.

Era um período de muita política na cidade, já que cada clube era ligado a um grupo. O Icaiçara era dos “azuis”, enquanto o Clube dos Vinte abrigava os “vermelhos”.

Mário Nelli, que nunca gostou de política, se apresentava nos dois palcos. “Na verdade, houve um grande interesse dos clubes por pessoas que tocavam instrumentos”, contou Mário, que já era especialista no piano, acordeão e violão. E, claro, tinha uma voz marcante.

 

Nos anos 1960, Mário Nelli “troca figurinhas” com seu ídolo Dick Farney, no antigo Clube dos Vinte

 

Foi em 1958 que, a convite do radialista José Eduardo Catalano, Mário Nelli passou a se apresentar no “Programa do Estudante”, nas noites de sextas-feiras no Clube dos Vinte. Em seguida, nas tardes de domingo, Mário dava o tom para as crianças no “Programa Rádio Clube Mirim”. Tudo era transmitido ao vivo pela Difusora Santa Cruz.

Foram alguns anos em que Mário nem tinha tempo de respirar. Ensaiava na quinta, se apresentava na sexta no “Programa do Estudante” — e em seguida tocava para uma “brincadeira dançante”. No sábado, ensaiava para no domingo estar ao vivo no “Rádio Clube Mirim”. Nas noites livres, ele ainda se apresentava em clubes da região.

Em 1959, ele fundou o grupo “Mário Nelli e o Conjunto do Clube dos Vinte”, com ele no piano, Arcílio Mardegan no contrabaixo, Laércio Mastrodomênico na guitarra, Nelson Bernardo na bateria, Dida na percussão e Gilberto Salomão como vocalista.

Entre 1960 e 1961, o presidente do Clube dos Vinte foi Carlos Queiroz, que mais tarde seria um dos grandes prefeitos da história de Santa Cruz do Rio Pardo. Foi aí que a cidade começou a receber artistas consagrados do rádio e televisão, como Cauby Peixoto, Pery Ribeiro, Ana Lúcia, Miltinho, Francisco Egydio e outros. Carlos Queiroz comprou vários instrumentos para o clube, inclusive piano.

Nesta época, Mário Nelli teve a felicidade de conhecer seu principal astro, Dick Farney, que esteve em Santa Cruz.

Mário e seu conjunto, aliás, passaram verdadeiros apuros em acompanhar os músicos, já que dificilmente havia ensaio. “Com o Miltinho, passamos um grande aperto. Ele chegou num domingo à tarde e nem deu tempo para conversarmos. Sem ensaio, ele me passou apenas um bilhete com as músicas que iria tocar. Tinha uma com uma melodia muito difícil e eu peguei o disco, decifrei o tom em fá maior e escrevi os acordes. Pouco antes da apresentação, chegou outro bilhete dizendo que ele queria o tom em mi bemol maior. Foi um sufoco, mas tudo deu certo”, contou.

O “Mário Nelli e o Conjunto do Clube dos Vinte” não era restrito a Santa Cruz do Rio Pardo. O grupo se apresentou nos quatro cantos do Estado de São Paulo

Ainda eram os anos 1960 quando a “Jovem Guarda” explodiu em todo o Brasil. Alguns integrantes do conjunto — caso de Arcílio e Laércio — não se interessavam muito pelo rock e o grupo se desfez.

 

 

Mário, então, criou outro grupo com Ezequiel da Silva e João Queiroz na guitarra, Elias no contrabaixo, Matheus na bateria e outros. Em alguns momentos, o conjunto ainda contou com Isaias Carvalho e Edinho Brondi.

O grupo se apresentava no Clube dos Vinte em Santa Cruz do Rio Pardo e em vários outros municípios. Certa vez, em Bauru, o salão do baile ficava no quarto andar e os músicos foram obrigados a levar pesados instrumentos, inclusive um órgão, pela escada. Uma verdadeira epopeia.

Em 1964, com Carlos Queiroz já prefeito de Santa Cruz do Rio Pardo, surgiu o “Emi Eni Sete”, que Mário Nelli considerava seu melhor grupo musical.

Nelli ficava no teclado, Renato Queiroz na bateria, Ezequiel e Vasco de Britto na guitarra, Elias no contrabaixo, Budu na bateria, Eduardo Pimentel no trompete e José Carlos Simões no saxofone. Durante um período, o grupo ainda teve Neilson Rios na guitarra.

Para Mário, foi o grande conjunto da época em Santa Cruz e sua fama se espalhou a ponto de ser convidado para se apresentar na televisão.

Foram novamente anos intensos, que Mário avaliava como “memoráveis e cansativos”. Afinal, ele cursava faculdade ao mesmo tempo em que o grupo viajava freneticamente para se apresentar em vários municípios.

Mas ao menos as brincadeiras nas viagens eram divertidas, geralmente infernizando os motoristas — Júlio Viol e, às vezes, Olheano Scucuglia. “O Vasco reclamava da baixa velocidade e dizia a eles que o Pixulim estava prestes a ultrapassar”, contou. Pixulim era um famoso pipoqueiro que existia em Santa Cruz.

O “Emi Eni Sete” foi se desfazendo porque seus músicos foram se casando e constituindo famílias. Mário já era professor.

Como a tecnologia dos instrumentos musicais avançou, ele passou a se apresentar sozinho. No início da década de 1970, era Mário Nelli o cantor do restaurante “Ypê”, em Ourinhos. Depois, durante uma apresentação casual em Garça, ele foi convidado para acompanhar um buffet durante muitos anos.

Em 1984, fez uma parceria com primos de Ourinhos e criou a “Banda Solar”.

 

Mário gostava tanto dos instrumentos que até colecionava miniaturas

 

Em 1997, Mário Nelli organizou a orquestra da Fundação Miguel Mofarrej, de Ourinhos, se tornando maestro. A orquestra chegou a gravar um CD.

Ele ainda fez dupla durante algum tempo com o músico Celso Camacho, de Bernardino de Campos.

Mário Nelli sempre teve o mesmo perfil jovem e magro, apesar das intensas atividades e dos anos de trabalho entretendo gerações.

Certa vez, durante uma apresentação em Assis, uma mulher se aproximou durante o intervalo e perguntou: “Por acaso você é filho daquele Mário Nelli dos anos 1960”?

 

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